Editorial: O jornalismo e a identidade cultural dos imigrantes

Por Arlaine Castro

Muito se discute sobre as identidades culturais que se formam com os grupos de imigrantes que buscam fortalecimento no lugar para onde se mudam. Os Estados Unidos é um dos países que mais recebe imigrantes em todo o mundo, e as comunidades são percebidas pelas bandeiras hasteadas, além do comércio e prestação de serviços com traços da cultura dos países de origem.

De igrejas a salão de beleza, passando por restaurantes e bares, o imigrante tenta de toda maneira se adaptar no país, mas mantendo laços com a origem. Trata-se de compreender as práticas culturais e adotar uma nova postura de acordo com a cultura local, pois é preciso viver conforme as regras e leis do país atual, e, na maioria das vezes, manter a identidade do país o qual se origina.

Conceitos como cultura, representação, identidade e imigração são apresentados a partir de autores como Stuart Hall (1997), que define a centralidade da cultura em função das significações dadas pelos sujeitos às práticas realizadas em sociedade, ou por grupos na sociedade. As ações distintas daquelas determinadas por programação genética, biológica ou instintiva são “ações sociais”, que requerem e são relevantes para as significações. A partir disso os seres humanos são tomados como seres interpretativos, instituidores de sentido, capazes de criar códigos que dão sentido às ações.

É o conjunto formado pelas ações e pelos códigos que permite interpretar significativamente as ações alheias, é isso que, no conjunto, constitui o “cultural”. Assim todas as ações sociais são culturais, uma vez que “expressam ou comunicam um significado e, neste sentido, são práticas de significação” (HALL, 1997: 16). Da perspectiva dos Estudos Culturais contemporâneos a cultura é tomada como ponto central na discussão e estudo dos fenômenos sociais, e determinante na alteração dos modos de viver, causando impacto sobre os sentidos dados à vida.

Um estudo acadêmico sobre imigração faz uma análise sobre a narrativa noticiosa e a construção discursiva da imigração na imprensa.

De acordo com o estudo, “o trabalho sobre temas familiares e a necessidade de produzir sentido igualmente familiar faz dos jornalistas “contadores de histórias” que, na sua narrativização dos acontecimentos, produzem e cultivam identidades políticas e culturais. Enquanto outras abordagens à análise das notícias, como as de gatekeeping ou as que partem dos valores-notícia (Galtung e Ruge, 1993), pressupõem um mundo factual de onde derivam as notícias, a abordagem discursiva parte do princípio de que não existe um mundo factual sem as estruturas conceptuais pelas quais essa realidade nos é disponibilizada (Bignell, 1997). Desta perspectiva, o campo fértil das notícias pode dizer-nos alguma coisa sobre como a forma como nos entendemos a nós e aos outros, enquanto membros de grupos e comunidades parcialmente construídos pelos media (Thompson, 1995: 35)”.

No entanto, as relações entre media e imigração não são unívocas, refletindo antes uma ambivalência que deriva do facto de os media retirarem a sua substância comunicacional não apenas da orientação estratégica (captação de audiências, escrita rotinizada com fins profissionais, etc.), mas também da sua constituição como agentes do espaço público, isto é, meios de reprodução simbólica da comunicação, formações simbólicas tecnologicamente enxertadas no mundo da vida. Neste processo, que é também de “agendamento”, são construídas identidades e lugares de desvio e normalidade. Quando os imigrantes são estigmatizados como “problemáticos”, mas também quando são relatadas as suas parcas histórias de “sucesso”, constroem-se socialmente as suas identidades e também a do Estado nacional que os recebe: como a norma a que o desvio se opõe, ou como a terra onde os sonhos acontecem, onde os imigrantes – tantas vezes vítimas das “suas próprias gentes” – têm a possibilidade de ser reconhecidos e dignificados.

Quando os imigrantes são estigmatizados como “problemáticos”, mas também quando são relatadas as suas parcas histórias de “sucesso”, constroem-se socialmente as suas identidades. E a imprensa tem parte nessa construção.

Stuart Hall (2003) vê as identidades culturais em crise em função das alterações que acontecem a partir das mudanças ocorridas na contemporaneidade. (…) É a partir das migrações modernas e no cada vez mais intenso deslocamento de populações entre países e continentes, ou mesmo dentro de um mesmo país, que tais alterações devem ser compreendidas.

Referências: Maria João Silveirinha e Ana Teresa Peixinho de Cristo, « A construção discursiva dos imigrantes na imprensa », Revista Crítica de Ciências Sociais, 69 | 2004, 117-137.