O marketing da Nike deve estar rindo à toa... - Editorial

Por Carlos Borges

nike

Os deploráveis espetáculos de alienação em que vivemos nos tempos atuais não param de acontecer, a cada dia mais bizarros.

De repente, no noticiário matinal, quando a gente tenta “se ligar” num mundo do qual a gente quer cada vez se ligar menos, chegam as imagens de uma praça de guerra. Milhares de jovens revoltados, depredam as instalações de um shopping center.

São cenas típicas das revoltas crescentes nos países árabes. Vandalismo total, ao mesmo tempo em que os “revoltados” exibem seus melancólicos gestos de “gangsta”, e “gritos de guerra”. Seria cômico se não fosse sério.

Não, meus caros leitores do Gazeta. Não se tratava de nenhum movimento libertário de jovens idealistas, tentando libertar sua terra e sua gente. Muito menos um motim contra aumento de impostos ou quaisquer tentativas de cerceamento da liberdade de expressão.

As cenas eram mesmo de uma turba de débeis mentais, revoltados na madrugada, exigindo que uma determinada loja abrisse suas portas para que os tais “guerrilheiros” pudessem comprar o novíssimo lançamento de tênis da Nike. Juro que, mesmo eu que me gabo de já não me surpreender com nenhum tipo de alienação pop, fiquei pasmo. Será que a economia norte-americana está se recuperando tão rapidamente assim, que é capaz de gerar um furor consumista por tênis de última geração ao preço de 220 dólares?

Bem, com certeza os executivos da Nike devem ter achado o máximo. Já sabemos que as corporações não têm nenhuma ética, como nunca tiveram coração. E têm mentes, sim, focadas unicamente no lucro, venha sob que forma vier, mesmo que seja através de um comportamento ‘bestial’, como o visto no shopping center de Orlando.

Nada de novo, temos que admitir. Afinal, semanas atrás, na China, hordas de consumidores ensandecidos disputavam no tapa os míseros restantes exemplares de I-Pad e destruíam a fachada de uma falsa loja credenciada da Apple, em Pequim. Tudo porque aqueles cidadãos não podiam mais entender a vida sem um I-Pad na mão.

Não nos iludamos. Vai ser daí para pior e o que mais me consola é que pelo menos minha geração talvez não seja obrigada a testemunhar selvageria high-brands como essas, em escala ainda mais incontrolável. Porque mais do que nunca parece que a mentira e a fantasia substituíra completamente qualquer ideia de bom senso.

A ação e eficácia do marketing do “modismo” está de tal forma entranhada na sociedade de consumo moderna que já não há mais nem discernimento para avaliar o frenesí pela posse de objetos de status, de demonstrações de poder e afirmação pessoal.

Não vale o que se sabe nem o que se constrói. Apenas o que se pode comprar e exibir, mesmo que não sirva para nada. E há ainda quem não acredite em plena decadência da humanidade...enfim. A mediocridade que cabe na vida de cada um, só pode mesmo ser uma escolha de cada um.

Que racionalidade ou equilíbrio se pode esperar de juventudes que saqueiam e destroem pela voracidade na compra de um par de tênis “de último tipo”? Que bom senso se pode esperar de sociedades em que a disputa por notoriedade e exibicionismo a qualquer preço se tornaram artigo atrativo no dia a dia da TV, dos ambientes de trabalho, das rodas de amigos e até dentro das famílias.

Não se trata de ser conservador ou antiquado. Antimarketing ou antinada. Apenas me pergunto, será mesmo que essa selvageria generalizada não é de fato estimulada em larga escala pelo “vale tudo” consumista a que estamos sendo expostos cada vez mais renitentemente?

Os impulsos para que compremos cada vez mais o que cada vez menos precisamos. A necessidade imperativa de vender, vender, vender para alimentar o círculo vicioso de um sistema que segue privilegiando uma minoria de manipuladores sobre uma legião de manipulados.

Seguimos mantidos na ignorância e no delírio da fantasia consumista, alimentando um estado de autofagia e autodestruição que poucos percebem por estarem muito ocupados em... consumir! Uma lástima!