O otimismo e a “bolha” - Editorial

Por Carlos Borges

de-olho-no-brasil

Ao mesmo tempo em que saboreia uma situação econômica que segue surpreendendo a tudo e todos, os brasileiros começam a discutir, especialmente através da mídia menos comprometida com o entretenimento e mais focada na discussão do futuro do país, até que ponto existe mesmo a ameaça de “estouro da bolha”. Sim, porque uma expressiva corrente de pensamento no Brasil imagina a possibilidade de que o atual surto de crescimento e estabilidade econômica do país tenha uma espécie de “data marcada” para “estourar” e provocar uma recessão semelhante a qual estamos só agora nos recuperando nos Estados Unidos.

Não há muitas razões práticas para imaginar que o sucesso brasileiro de agora seja meramente casual. Só mesmo o antigo complexo de inferioridade ou o pessimismo profissional que por décadas foi marca registrada do brasileiro, poderiam acreditar que doze anos de contínuo progresso econômico teriam acontecido “por acaso”.

Se a certeza de que o caminho do progresso brasileiro parece mesmo ser irrevessível, não há como negar que os que temem a “bolha” têm algumas razões ponderáveis para exibir uma gigantesca interrogação em suas faces.

Certamente a principal dessas preocupações é o contínuo desinteresse dos executivos – municipal, estadual e federal – em priorizar obras de infraestrutura que são essenciais para que o caudal de entrada de investimentos no país possa ser efetivamente canalizado para um progresso que atinja as mais diversas camadas da população brasileira.

Se a malha portuária tem sido relativamente modernizada, sua básica contrapartida, que são as ferrovias e rodovias, seguem no mais patético nível de terceiro mundo. A exceção de algumas rodovias em São Paulo, a malha rodoviária do Brasil de 2012, faz vergonha com relação até mesmo a países que nem sonham em exibir nossa pujança econômica.

Nossos aeroportos seguem sendo motivo de justificáveis dores de cabeça. E nao é apenas pensando em eventos temporários como Copa do Mundo e Olimpíadas. Certamente queremos passar um recibo decente com relação aos milhares de visitantes que teremos durante esses dois eventos mundiais em 2014 e 2016, mas o verdadeiro alvo de mudanças estruturais em nossos terminais deve ser mesmo o viajante brasileiro.

Os dados estatísticos mostram que somente a China tem experimentado um crescimento do movimento aéreo em todo o planeta. O transporte aéreo no Brasil tem rapidamente se democratizado, com um volume de passageiros e carga transportados que vai nos colocar entre os 8 maiores do mundo. Mas nossos aeroportos são de terceira categoria, desconfortáveis, perigosos, desaparelhados e incapazes de, nos dias de hoje, atender à demanda que tiveram em 2002, 2003.

A saúde pública é outro setor onde os avanços são mínimos e quem, no Brasil de 2012, não tenha condição de ter um seguro saúde privado, fica à mercê de um dos sistemas mais precários existentes entre os países emergentes. Pior do que o sistema de saúde pública do Brasil, só mesmo na África ou em países extremamente pobres da América Latina e Ásia.

Se queremos entrar rapidamente no “clube dos ricos”, ou, na pior das hipóteses no “clube dos emergentes de fato” , como nossos indicadores econômicos já nos colocam, é preciso que o Brasil, através da postura reinvidicatória dos brasileiros, exija um sistema de saúde pública que acabe de vez com pessoas morrendo em filas de hospitais, falta crônica de medicamentos e, sem esquecer, da remuneração humilhante e desestimulante que os profissionais de saúde brasileiros recebem dos municípios, estados e da União.

O Brasil rico, sexta economia do mundo, crescente em ritmo de “quase China” precisa estar atento não apenas aos recordes dos números e dos índices, mas sobretudo a inclusão social e a qualidade de vida.

Nessa busca por um “upgrade” de verdade e não apenas de mais dinheiro no bolso para gastar com objetos de consumo ilusórios, é em última instância o brasileiro quem deve reinvindicar e pressionar os políticos – eles mesmos, que adoram aumentar constantemente seus próprios salários enquanto diminuem os dias de trabalho – para que façam sua parte.