O vilão que os americanos adoram odiar

Por Gazeta Admininstrator

Mais uma vez os noticiários da TV, jornais e revistas norte-americanos estão poluídos com a imagem patética de um dos mais evidentes símbolos do culto doentio às celebridades: o ex-astro de futebol americano e ex-ator O.J.Simpson.
Simpson, que protagonizou nos anos 90 uma das mais polêmicas absolvições da história judiciária norte-americana, sendo inocentado da acusação de ter matado a esposa, Nicole, e um amigo, nunca conseguiu escapar da certeza, que 80% dos norte-americanos têm, de que ele foi o autor dos crimes e só escapou porque era rico, famoso, pode contratar poderosos advogados e ainda transformar seu julgamento numa questão racial.
Passados 15 anos do julgamento que paralisou a América e deu início ao fanatismo que a mídia tem por escândalos intermináveis com celebridades, O.J., que mora em Fort Lauderdale, retornou às manchetes graças a uma bizarra acusação de assalto à mão armada, em Las Vegas.
Conforme mostram gravações de áudio, O.J. está sendo acusado de invadir e roubar peças de coleção vendidas por ele mesmo a um ex-sócio.
Mais uma vez, quando parecia que a opinião pública iria saciar a sua sede em ver O.J simpson atrás das grades, ainda que pagando uma pena muito mais leve do que a maioria da população gostaria, eis que o “fenômeno” consegue ser liberado sob fiança e já não há grandes indicações de que a promotoria tenha um caso muito forte para colocá-lo na prisão por muito tempo.
Na saída de O.J. do Tribunal em Las Vegas, haviam fãs pedindo autógrafo. Sua namorada já de vários anos ( e que tem incrível semelhança com a assassinada Nicole Simpson), estava lá, fielmente a seu lado, desconhecendo a hipótese, quem sabe, de que um dia possa ser vítima de crime parecido ao que vitimou Nicole.
O que mais chama atenção no “caso de amor e ódio” entre o público, a mídia e O.J. Simpson é o caráter cada vez mais doentio e intrigante da relação do público em geral com a vida das celebridades.
Mais que isso. Numa completa inversão de valores, as demonstrações recentes de ídolos da música pop, do cinema e dos esportes, revelam que cada vez mais a preocupação em aparecer a qualquer custo, estar na mídia a qualquer preço, não tem nenhuma relação com a imagem a ser propagada ter algo de positivo.
A lei do “falem bem ou mal mas falem de mim”, que os hipócritas preferem definir como “não existe publicidade ruim”, está se impondo de tal forma na sociedade, que colocam em questionamento os próprios fundamentos da sociedade, tais como a honestidade, os valores humanos, caráter e princípios.
O que está acontecendo afinal? Seria o bastante atribuir à mudança “natural” dos tempos, a crescente, diria “imparável” marcha das novas gerações para uma sociedade brutal e sem lei, onde apenas e tão somente as medidas de valor materiais como a fama, o poder gerado pelo dinheiro e a beleza física, importam e são celebrados?
Qual é o papel de cada um de nós nesse processo? Temo que, tristemente devamos reconhecer que os marqueteiros estão mais próximos da verdade do que gostaríamos, quando apontam para a própria sede de sangue, drama e fantasia, exacerbados, que demonstram as populações de todo o mundo.
Isso mesmo, de todo o mundo. Ninguém tenha a ilusão de acreditar que esse fenômeno de gigantesca imbecilização da humanidade ocorra apenas em sociedades mais ricas ou mais dominadas pelo controle lobotômico da mídia.
Bom senso nunca foi a qualidade mais forte do ser humano. Se fosse não seriam necessárias tantas leis, códigos e princípios na tentativa de “enquadrar” nosso natural comportamento símio ou bestial.
Mas, aos “trancos e barrancos”, aprendendo com guerras e pestes, creio que a raça humana tem feito alguns importantes progressos. Estes tempos de agora estão sendo, mais uma vez, de teste para a tolerância de alguns diante do trogloditismo de tantos.
Há uma retração imensa da educação, um desapego total à cultura, um distanciamento de todo e qualquer comportamento civilizado que não seja aquele que só é seguido por temor de se ir para a cadeia.
Cultiva-se, sim: o sagrado culto à propriedade ilimitada e a acumulação de bens individuais.
O carro em vez do trem. O casamento por conveniência ao invés do amor.
Substitui-se a honestidade pelos prêmios para quem denuncia ou devolve o roubo.
Humilha-se quem não está dentro dos padrões das telinhas ou das passarelas.
Todos querem um autógrafo do assassino da semana. Às vezes, até com muito mais afã do que o autógrafo do artista de sucesso, pelo talento e pelo esforço. Bate-se palmas para quem vence, exibe, esnoba e humilha.
Nessa atmosfera de caos moral, ético e humanístico, nada exemplifica melhor a obsessão Pela gratificação instantânea e vazia, que tipifica nossos tempos, do que essa “celebridade torta” que é O.J.Simpson.
Mas é como vivem me dizendo alguns amigos e colegas: “Mas não é isso que dá ibope?”