Obama e o racismo

Por Gazeta Admininstrator

Está tudo muito bem, tudo muito bonito. A democracia norte-americana, mesmo enxovalhada por uma crise moral sem precendentes, com escândalos e mais escândalos de corrupção e as podridões que assolam o mundo político em Washington, dá suas demonstrações de vigor e de aparente firmeza. Um negro é candidato a presidente. Uma mulher a vice.
Os tempos estariam mudando?
Nem tanto.
No país onde, ao mesmo tempo coe-xistem as mais diversas leis que punem a discriminação e o preconceito, é justamente o preconceito racial que pode impedir o senador Barack Obama de se tornar o primeiro negro a ocupar a Casa Branca.
Certamente, qualidades intelectuais de de currículo não faltam ao senador democrata que, em apenas quatro anos, se tornou a mais reluzente estrela do legislativo norte-americano.
Seu oponente, o também senador republicano John McCain não tem, nem de longe, o que exibir como currículo, a não ser seu melodramático passado como herói de guerra.
Mas nada é mais forte do que os ‘ins-tintos primitivos” do ser humano. E o eleitor, antes de tudo, é um ser humano, cheio de inseguranças, preconceitos, vícios e temores.
Pesquisas apontam já de forma clara o que há muito tempo se cogita nos bastidores:
O maior inimigo da considerada quase certa vitória de Obama é justamente a cor de sua pele. E olha que para os padrões brasileiros o Obama poderia ser considerado o que dizemos com muita naturalidade na Bahia, um “moreno clarinho”...
Na América, onde qualquer um que não seja cor de leite é considerado “não-branco”, Obama é mesmo negro, e há milhões de eleitores norte-americanos, brancos, idosos e arraigados num passado de divisões e ódios, que se separam entre a revolta só em pensar em eleger um presidente negro e o temor (totalmente infundado) de que Obama viesse a realizar uma “presidência para os negros”.
A mídia, com o estardalhaço de sempre, já está abrindo essa discussão que foi mantida à parte do processo justamente pelo temor, que todos na América têm, em expor essa velha e aberta ferida na sociedade mais rica e também mais didivida do planeta.
Antes que os mais apressadinhos tirem conclusões, os Estados Unidos ainda são, ampla e majoritariamente uma nação “branca”. Os negros são apenas 42 milhões e já são superados até pelos hispânicos que somam 46 milhões, segundo o último censo atualizado. Como os asiáticos somam cerca de 13 milhões, restam 200 milhões de “brancos” e são eles, em última análise, que decidem a eleição.
O voto latino é, hoje, considerado o “fiel da balança” entre democratas e republicanos e ao contrário do que muitos pensam, o votos dos latinos nem é necessáriamente em favor das minorias (leia-se Obama) nem necessariamente a favor dos republicanos (que apesar da ironia, sempre elegeu presidentes, até pragmaticamente mais favoráveis aos imigrantes ilegais).
Não se esqueçam que no auge da discussão sobre a reforma imigratória, o presidente George W. Bush apresentou, por duas vezes, as emendas que dariam um caminho de legalização a 12 milhões de indocumentados. Foi o Congresso quem inviabilizou tais projetos.
Não se esqueçam também que há 3, 4 anos, o senador McCain era um dos raros republicanos “campeões” da causa dos ilegais. Agora, como candidato republicano, e sabendo da oposição da ala de extrema direita do partido à causa dos ilegais, McCain, como bom “marketeiro” de campanha, mudou o discurso e é até favorável ao “muro da vergonha”, que separa o México dos Estados Unidos.
Obama também não tem sido nem um pouco competente em cortejar o voto latino. Todos sabem que os latinos (60% de origem mexicana) votarão no candidato que tiver uma proposta concreta de legalização dos 12, 14 milhões de indocumentados. Obama tem pânico de assumir esse compromisso em público. Sua esposa, Michelle, é quem tem sido “porta voz” dessa possibilidade. Mas sua voz é pouco disseminada.
No frigir dos ovos, a eleição mais importante das últimas décadas, a que pode mudar o rumo da América ou intensificar o continuísmo que está levando o país ao anunciado declínio, pode se resumir numa ridícula disputa entre “o branco” e o “o negro”.
Nada mais lamentável, nada poderia ser pior.
Mas esta é a cara da América. Uma nação poderosa, trabalhadora, criativa, mas mergulhada em seu proprio labirinto de preconceitos e culto à imagem superficial.