Negros são a história do Brasil. Mas e o presente?

130 anos se passaram desde a abolição da escravatura, mas a maior taxa de analfabetismo, os menores salários, a maior violência e desemprego recaem sobre os ombros dos negros.

Por POR | Arlaine Castro

Arlaine

Quando se fala sobre a população negra no Brasil, logo vem à mente, em um contexto histórico, os escravos levados da África.

Pensar sobre negros no presente e no futuro é mais difícil, mas não deveria ser. Hoje, 519 anos depois, como estão seus descendentes? A Semana da Consciência Negra foi criada com esse objetivo: pensar o presente e o futuro da população negra e parda no Brasil. Algumas pessoas dizem que não precisa, que isso (o fato de separar um dia ou semana em homenagem) denota preconceito. Preconceito é tapar os olhos para uma realidade desigual que sabemos que existe.

Sabe por que é desigual? Porque ainda há um caminho longo a percorrer. Para uma raça que é metade de toda uma população de um país e não está representada nas empresas, nos cargos públicos, nos melhores restaurantes, nos aviões, nas salas de aulas, enfim, nos lugares que há mais de 500 anos estão dominados por brancos. Em 2017, 50,7% das crianças até 5 anos que morreram por causas evitáveis eram pardas e pretas, enquanto 39,9% eram brancas, segundo dados do Ministério da Saúde.

Não se trata de uma guerra. Trata-se de igualdade. Em termos de representatividade, "a população preta ou parda - correspondente a 55,8% dos brasileiros - não elege pessoas da mesma cor. Na esfera federal, 24,4% dos deputados eleitos se declaram pretos ou pardos. O cenário se repete nos estados: 28,9% dos representantes públicos pertencem ao grupo demográfico majoritário", cita em matéria especial a Agência Brasil.

E por falar em escravos, apesar de terem sido libertos desde 1888, para alguns, essa vida sofrida ainda não acabou. A cada cinco trabalhadores resgatados em situação análoga à escravidão entre 2016 e 2018, quatro são negros. Esse foi o levantamento feito pela Repórter Brasil, com base em dados obtidos da Secretaria do Trabalho, por meio da Lei de Acesso à Informação.

Pretos e pardos representam 82% dos 2.400 trabalhadores que receberam seguro-desemprego após resgate. Entre os negros resgatados estão principalmente homens (91%), jovens de 15 a 29 anos (40%) e nascidos em estados do Nordeste (46%). E a maioria dos resgatados não concluíram o ensino fundamental: 56%. Entre o total havia ainda 14% de analfabetos.

Claro que durante todos esses anos, houve ganho. Ainda bem. Nesta semana em que a pauta se volta aos negros, a pesquisa Desigualdades Sociais por Cor ou Raça Brasil, feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), descobriu que os pretos ou pardos somam 50,3% dos alunos regularmente matriculados no ensino superior público. Pela primeira vez em mais de 500 anos. Ou seja, são mais do que os brancos nas universidades e faculdades do país. Mas, caros leitores, olhes para trás e pensem no tempo que levaram para chegar a esse número. Isso é análise.

E mesmo assim, apesar do número de estudantes dessa parcela populacional ter aumentado, o abandono dos cursos ainda é alto - 28,8% desses alunos não chegarão a graduação, diz a pesquisa. Ou seja, a dificuldade para se manter no banco escolar até a formatura é muito maior.

Sem contar a segurança. Segundo o Anuário de Segurança Pública 2019 elaborado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, jovens negros são as principais vítimas fatais em ações policiais. Um dos especialistas do Fórum apontou o racismo estrutural que existe no Brasil entre os fatores que explicam o fato de que muito mais negros do que seus compatriotas brancos são mortos por tiros da polícia.

Cento e trinta e um anos se passaram desde a abolição da escravatura, mas a maior taxa de analfabetismo, os menores salários, a maior violência e desemprego recaem sobre os ombros dos negros. Para essa raça, viver ainda é travar uma batalha diária.