Pais & Filhos: Pinóquio ou a busca por virar gente grande

Por Adriana Tanese Nogueira

pinoquio

A história de Pinóquio esconde uma mensagem intrigante. Vejam bem, Pinóquio é um boneco de pau e toda sua trajetória se reconduz à questão: seguir o que o pai (adotivo) lhe diz ou desviar-se do caminho seguindo suas próprias pulsões do momento? A salvação vem da fadinha (mãe adotiva) que o ilumina sobre o fato que ele deve aprender a assumir em primeira pessoa suas escolhas, sendo responsável e consciente. Esse percurso é marcado por sua relação conflitiva com o Grilo Falante o qual, como todos sabemos, representa aquela coisa “chata” que se chama consciência.

A consciência é aquela voz que questiona as nossas ideias, crenças, pulsões, desejos. Não todos. A consciência questiona para fazer uma triagem, para separar o joio do trigo. A consciência debate a validade de isso ou daquilo, se algo que antes era válido ainda o é, se aquilo que se pensa se quer de fato se quer, etc... A consciência de Pinóquio põe em discussão duas coisas basicamente: o trabalho, o mundo das obrigações, responsabilidades, aprendizado (que é trabalhoso) e seu se deixar levar pelos outros.

Aprender a trabalhar é trabalhoso. Significa aprender a dedicar-se, manter o foco, a concentração, estar sentado numa cadeira por mais tempo do que se gostaria ou ocupado com algo que não aparenta solução imediata. Aprender é trabalhoso, trabalhar é um esforço. Toda conquista é esforço.

Esforço é recolher a própria energia no lugar de desperdiçá-la em atividades que não produzem trabalho, recolhê-la, canalizá-la e levá-la para outro nível que é o da produção de algo novo, um novo aprendizado ou um novo produto criado.

As crianças precisam ser educadas para conseguir realizar tal esforço, educadas para o trabalho – o que é um trabalho que cabe aos pais. Estes mostram com o exemplo o que é dedicação, responsabilidade e perseverança e ensinam colocando a criança na condição de poder desenvolver essas qualidades. Como? Dando-he responsabilidades e tendo paciência no processo.

Os jovens, em geral, precisam ter responsabilidades adequadas a seu momento de desenvolvimento psico-físico, se forem demais ou de menos estaremos prejudicando a criatura. Cada passo nesse aprendizado precisa ser suportado pelos pais porque sair do fácil para o difícil não é fácil para ninguém, certo?

A outra coisa que Pinóquio precisa vencer é aquela de se deixar levar pelos outros. Como se ajuda um filho nisso? Dando força para seu Grilo Falante, ou seja, investindo em sua consciência. Quando a criança ou o jovem está lá fora com os amigos não há melhor orientação, melhor luz no caminho que sua própria consciência. A consciência fala, alerta, vê, enxerga, denuncia. Ser boneco significa não ter autonomia. Ser boneco é ser manipulável. De qual autonomia estamos falando? Da autonomia do pensar em primeira pessoa, por exemplo, da autonomia do fazer e assumir o que se faz e se escolhe, da autonomia de decidir conforme a própria cabeça.

Para ajudar um filho a ter essa consciência é preciso ensinar que ser diferente é bom, que não gostar de tudo o que os outros gostam (ou aparentam gostarem) é bom, que as inclinações particulares do filho merecem ser ouvidas, que o que ele sente merece ser acolhido, que o que ele pensa merece ser discutido aberta e livremente.

Tratando um filho como um indivíduo único, estaremos desenvolvendo nele sua unicidade. Sentindo-se tratado como alguém que tem um valor próprio único, um filho se porta no mundo como alguém que pode pensar com sua cabeça, está capacitado a enfrentar os desafios. E o primeiro e maior desafio de todos nós é a inserção criativa no grupo que mantém viva nossa verdade interior.