O processo psicológico da morte - Viver Bem

Por Adriana Tanese Nogueira

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Se essa é nossa única vida e se pó somos e pó voltamos a ser - pelo menos no que diz respeito ao nosso corpo – que é o que e define a identidade da enorme maioria das pessoas – então a morte é apavorante. Num tempo de cristãos tradicionalistas e ateus/céticos, morrer é, em qualquer caso, um evento assustador. Enquanto isso, a medicina tenta de todas as formas segurar a vida, postergar seu fim - custe o que custar. A perspectiva de vidas passadas oferece uma nova visão da morte. Que esta seja um desprendimento não há dúvidas, mas ao deslocar, ou talvez melhor, ao ampliar nossa identidade para além do ego - algo bem próximo do que Jung chamava de Self - o desprendimento resulta mais fácil e menos pavoroso.

Na terapia de Deep Memory Process de Roger Woolger, a morte é considerada um momento focal do processo terapêutico de vidas passadas, e por dois bons motivos. Em primeiro lugar porque todos os casos confirmam o que os tibetanos já sabiam desde o século VIII a. C. (vide o Livro Tibetano dos Mortos), ou seja, que no momento da morte ocorre o fenômeno da consciência amplificada a qual “imprime com exagerada intensidade os últimos pensamentos, sentimentos ou sensações no veículo - quer o chamemos de alma, espírito, corpo sutil ou akasha - que é transmitido para uma vida futura.” (Woolger, As Várias Vidas da Alma. Um psicoterapeuta junguiano descobre as vidas passadas, p. 180). Essas impressões serão reeditadas na vida seguinte pelas novas experiências que a pessoa for viver, sendo que de alguma forma irão limitar o raio de ação da nova vida porque vão funcionar como um centro gravitacional em torno do qual vai rodar a nova vida ou alguns aspectos significativos da mesma.

Toda sessão de regressão passa pelo momento da morte. É frequente, inclusive, que a pessoa comece a regressão se vendo no momento da morte, porque é de lá que vêm as feridas cujos sintomas estão presentes nessa vida. Em geral, como todos sabemos, são os eventos violentos, indigestos, difíceis de processar que produzem rastros. O mesmo vale em qualquer vida. Portanto, as mortes que mais precisam de cura são aquelas que não gostamos de lembrar. Retornar lá, no aconchego de um consultório com um guia capacitado e confiável, permite curar sintomas que sobreviveram a todo tipo de terapia médica e psicológica.

O segundo motivo pelo qual vale a pena reviver a morte está relacionado com o ganho produzido pelo desapego. Ao processar e curar uma morte, liberamo-nos do apego ao personagem daquela vida. A personalidade que carregávamos por causa de seus assuntos pendentes é finalmente superada: integrada-curada-superada. E um novo capítulo de nossa vida se abre. Por exemplo, o medo do avião que não tem fundamento nessa vida (ou seja, nenhuma experiência pessoal ou relacionada a pessoas próximas) está fincado na experiência de outra personalidade - uma das muitas que levamos conosco. A psique é múltipla. É preciso abadonar o conceito monolítico de uma personalidade só. Como disse Jung, o ego é um complexo suficientemente forte para se manter solidamente integrado, mas não é o único habitante de nossa vida. Portanto, dar serenidade ao tristonho lá no canto, dar paz ao violento no outro canto e sossego à apavorada no terceiro canto vai fazer bem a todo o conjunto psíquico.

Processar a morte conscientemente, como acontece numa sessão de regressão, permite também que fantásticas revelações aconteçam. Visões arquetípicas, compreensões profundas, iluminações sobre o além, o sentido da vida, da nossa vida produzem na psique de quem passar por isso, clareamento, encontro, centramento e uma nova, mais madura abordagem à vida, a si mesmos e aos outros.

*Adriana Tanese Nogueira é psicanalista e life coach www.ATNHumanize.com