Quando pensar faz mal à saúde - Viver Bem

Por Adriana Tanese Nogueira

pensar

Observando as muitas ideias que me vêm à cabeça e seu desenvolvimento em longo pensamentos e raciocínios interessantes, percebo que se não as botar em prática na hora que chegam, ou muito perto disso, acabo por perder o ímpeto que levaria à realização. Parece que quanto mais se pensa, mais fica difícil agir.

De fato, pensar demais é nocivo e produz uma perturbação psicológica digna de muitas sessões de psicoterapia. O pensamento excessivo revela, na verdade, uma deficiência. As pessoas dotadas de pensamento ágil, as “inteligentes”, facilmente inflacionam esse dote e o transformam em algo tão prejudicial quanto a própria falta dele. O calcanhar de Aquiles de muitos “pensadores” é justamante sua falta de ação. Quando os raciocínios funcionam e correm fáceis, acontece uma espécie de encantamento psíquico. Tem-se a sensação de que pensar seja suficiente, meio que se “esquece” de agir, tudo tende a ficar “na cabeça”. O “pensador” justifica sua “exuberância” de várias formas: ele quer “ter certeza”, quer ser “cauteloso”, quer “fazer a coisa certa”, e etc. Como pensar sai espontâneo e confiante, e ainda por cima aparenta ser um ato nobre e cheio de sentido, termina por assumir conotações mágicas, e o feitiço se volta contra o aprendiz feiticeiro.

Toda vez que surge o ímpeto na direção de alguma coisa, ele é “filtrado” pelo pensamento e lá dissecado indefinitamente até não sobrar mais nada dele. A fantasmagoria de pensamentos e raciocínios tão convincentes e sensatos encobre como uma capa da invisibilidade outros aspectos de nós mesmos, principalmente todas as emoções que negariam a legitimidade de tantas belas idéias. É então que o pensar se torna neurótico: um modo de evitar sentir e, sobretudo, evitar aquele sentir que leva à ação. A paixão do corpo que ascende à cabeça é assim assassinada com elegantes e lineares raciocínios, todos lógicos e fundamentados em “responsabilidade e boas intenções”.

Segundo Platão, a alma humana está dividida em três aspectos: razão, vontade e desejo. A elas correspondem três partes do corpo: cabeça, tórax e abdômen. Em seu livro, “A República”, o filósofo se refere a esta estrutura para dizer que assim como acontece com o indivíduo, o coletivo também está dividido em três partes distintas, todas importantes para seu funcionamento: a classe dos governantes, a dos guerreiros e a dos artesões (em linguagem moderna, dos trabalhadores). O desequíbrio de uma das partes leva à alguma forma de tirania. Se é verdade que a cabeça deve comandar, ela porém não existe sem o restante do corpo com suas outras qualidade. O conjunto deve permanecer unido para que tenha o poder e os efeitos esperados.

Se transportarmos o modelo platônico para a psicologia, vemos que quem dá muita ênfase ao abdômen se torna ganancioso, lascivo e desregado; investir no tórax é, como muitos halterofilistas mostram, valorizar a defesa, o lado guerreiro, produzindo deficiência em outros áreas, como o prazer da vida e o sentido da mesma. Quem, por sua vez, concentra suas energias no pensar tende a se tornar fraco na hora de agir, ou seja, medroso e covarde, e com o tempo perde a espontaneidade, pois seus desejos são constantemente manipulados pelo pensamento que lhes tira seu poder revolucionário.

Pensar demais, portanto, faz mal, e faz mal a todo o conjunto do nosso ser, chegando um dia impreterivelmente a prejudicar nossa própria saúde física.