Quem tem fé, vai a pé

Por Gazeta Admininstrator

Por: Connie Rocha

Esta frase soa como um verdadeiro bálsamo para quem enfrenta os 8 quilômetros de caminhada durante o cortejo ao Senhor do Bonfim, que acontece todo ano, em janeiro, na cidade de Salvador. Segunda maior festa popular da Bahia, depois do Carnaval, a lavagem das escadarias da igreja do Bonfim reúne fiéis, turistas, políticos, imprensa e curiosos.

Registrei momentos incríveis, neste dia que reuniu cerca de 1 milhão de pessoas, segundo a assessoria da Polícia Militar. A devoção das baianas, vestidas à carater debaixo de um sol “soteropolitano” de 30 graus, a popularidade de políticos, durante todo o trajeto, e o personagem principal desta festa, o povo.

Como baiana, senti orgulho de fazer parte de uma das celebrações religiosas mais importantes da minha cidade, e que divido com vocês, leitores do Gazeta, através desta reportagem especial.

Onde tudo começa
A nossa caminhada teve início por volta das 8 e meia da manhã, em frente a igreja Nossa Senhora da Conceição da Praia, onde foi realizado um culto ecumênico, e seguiu até a igreja do Bonfim. Durante o trajeto, cânticos e bandinhas embalavam os fiéis e amenizam o cansaço e forte calor. Pelas ruas históricas de Salvador, pessoas de todas as raças e classes sociais formam um tapete humano, em direção à Colina Sagrada.

Na chegada ao Bonfim, as ruas parecem mais estreitas, a multidão se aglomera, e todos querem chegar até a igreja. Este ano, pela primeira vez, em mais de 250 anos, um padre abençoou o cortejo. A bênção do padre Edson Menezes aconteceu quando cerca de 500 baianas, todas vestidas a caráter, lavavam as escadarias da igreja.

Outra novidade de 2009, foi a porta principal da igreja que permaneceu aberta, por determinação da Arquidiocese de Salvador. Desde 1890, durante a lavagem das escadarias, a igreja sempre esteve fechada para evitar a eventual destruição de imagens sacras.

Entre as tradições da festa, a presença dos políticos baianos, é quase que essencial. Tem a comitiva do prefeito, este ano, liderada pelo atual, João Henrique Carneiro- PMDB, a do governador (Jaques Wagner -PT), e a comitiva no qual fui convidada a participar, com a presença do ex-governador Paulo Souto (DEM), do senador César Borges e dos deputados federais José Carlos Aleluia (DEM) e Antônio Carlos Magalhães Neto (DEM), que mostrou a mesma popularidade do avô, o falecido senador Antônio Carlos Magalhães, que sempre participou da festa do Bomfim. ACM Neto estava acompanhado do pai, senador Antônio Carlos Magalhães Junior (DEM), e retribuiu as diversas demonstrações de carinho da população.

Clima de Paz
Apesar da multidão que só aumenta durante o cortejo, o que vi foram muitas demonstrações de fé e sincretismo, num clima de total harmonia tomando conta das ruas históricas de Salvador. Segundo estatísticas, a celebração religiosa da lavagem não registra muitos atos de violência, mas, este ano, um protesto contra o aumento da tarifa de ônibus, gerou confusões entre estudantes e seguranças da comitiva do prefeito. O incidente foi controlado sem graves consequências e o cortejo aconteceu em clima de paz. E por falar em paz, um momento especial desta minha trajetória foi a visita ao Memorial Irmã Dulce, no Largo de Roma. Um museu em homenagem à religiosa cuja vida foi dedicada à busca de recursos para amparar a população carente.

No memorial também estão os restos mortais de Irmã Dulce, o quarto simples onde ela descansava, e um museu com acervo de 9 mil objetos relacionados à vida e à obra da freira.

O profano Bonfim light
Apesar de religioso, nem só de fé vive o povo baiano. Muito pelo contrário, tudo é motivo para festa e como não poderia deixar de ser, a festa do Bonfim também tem seu lado profano. Uma intervenção da Prefeitura Municipal e da Arquidiocese de Salvador, em 1998, separou a festa religiosa dos trios elétricos e caminhões de blocos alternativos que acompanhavam o cortejo.

Surgiu, então, o Bonfim Light que, este ano, aconteceu no espaço Bahia Marina, voltada para a baía de Todos os Santos. A animação ficou por conta do Asa de Águia , Jammil e do cantor Tomate, permitindo aos foliões celebrar o dia do Senhor do Bonfim em clima de carnaval.

E a festa do Bonfim é assim. Milhares de pessoas de diferentes raças e crenças, vestidas de branco, se misturam entre as tradicionais baianas, políticos, jornalistas, fotógrafos, turistas e grupos culturais como o “Filhos de Ghandi”, todos embalados pelo hino do Senhor do Bonfim e com a alma lavada pelo perfume de alfazema dos banhos de cheiro. O sagrado e o profano juntos em busca de paz.