Reforma da pós-graduação no Brasil

Por Fernando Rebouças

Atualmente, no Brasil, estamos discutindo a Reforma do Ensino Médio que, de fato, deve ser reformado com investimentos e maior diálogo com estudantes e professores. Mas, no país também há problemas no processo de seleção dos cursos de pós-graduação, principalmente, em determinadas universidades públicas.

No Brasil, quando o estudante pretende cursar mestrado e doutorado, é necessário identificar uma linha de pesquisa numa determinada universidade, pesquisar e elaborar um pré-projeto de 3 a 12 páginas. Depois da aprovação do pré-projeto, o estudante realiza a prova escrita a partir de bibliografia sugerida no edital de seleção e , caso passe, realiza a prova oral e a entrevista. Tudo poderia ser perfeito no Brasil, considerando que, em alguns países, mestrandos e doutorandos são selecionados a partir de carta de recomendação de sua universidade de origem ou por intermédio de uma única prova e demais provas internas.

Sou graduado e pós-graduado na área de comunicação e marketing, estudei com muito sacrifício para me formar como bolsista e ainda enfrento os desafios de evoluir profissionalmente no Brasil. Neste ano de 2016, decidi conhecer o curso de mestrado em Educação da Unirio (Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro), instituição de ensino superior situada na zona sul da cidade do Rio de Janeiro. Identifiquei a linha de pesquisa com o corpo docente e comecei a revisar e elaborar sozinho as minhas pesquisas.

Redigi um projeto relacionado à autocomunicação e formação do indivíduo, na primeira fase o meu projeto foi aprovado me classificando para realizar a segunda fase composta por uma prova discursiva. No dia da prova escrita, compareci ao local de prova e redigi a tarde inteira entregando sete laudas redigidas e revisadas à mão e apesar de todo meu esforço a minha prova foi mal avaliada com uma nota abaixo do esperado, mesmo assim fui classificado para a terceira e última fase composta pela prova oral e entrevista. Na terceira fase fiz uma boa apresentação de meu projeto e de minhas estratégias de pesquisas que seriam transparentes e consoantes com o núcleo de ética da universidade, respondi às perguntas de modo bem fundamentado por cerca de 30 minutos e, mais uma vez, fui mal avaliado. Apesar da pontuação ser abaixo das expectativas de meu esforço e da desenvoltura correta em relação às questões de avaliação, consegui somar 71 pontos no total. Segundo o edital, para o candidato ser aprovado é necessário obter nota mínima de 70 pontos, porém eles atribuem uma margem mínima de 35 pontos na prova oral para eliminar o candidato mesmo que ele atinja a pontuação total de aprovação.

Mas, há outras situações que me chamaram a atenção. Durante a realização da prova escrita (segunda fase) escutei conversas de estudantes que diziam que conheciam alguns professores da Unirio há determinado tempo, que conheciam o estilo de aprovação de determinada linha e para piorar o ambiente presenciei candidatos serem recebidos nos locais de provas com beijos e abraços dos professores que compõem o corpo docente do curso e da instituição. Ao analisar o resultado do processo seletivo do mestrado em Educação 2017 da Unirio verifiquei que alguns dos candidatos que estavam pré-selecionados como orientandos dos professores que compõem a comissão de seleção e recursos de resultados tiraram as maiores notas e até a nota máxima. Não questiono a capacidade dos candidatos aprovados ou reprovados, mas é muita coincidência. O quadro piora quando candidatos que se inscreverem para determinados professores que compõem a banca de recursos e seleção tiraram as maiores notas. Ou seja, os professores que estão listados como possíveis orientadores dos candidatos são os mesmos que avaliam as provas e compõem, em parte, a banca de recursos e avaliação.

Durante o processo seletivo relatei sobre as minhas observações a respeito do processo seletivo aos professores que compõem a chefia e o setor de recursos do processo seletivo e não recebi nenhuma resposta. Vale ressaltar que a nota aplicada na prova oral depende, inicialmente, da percepção quase pessoal do professor que entrevista o candidato, mas o que explicaria o fato de um candidato tirar uma nota mediana ou alta na prova escrita (2ª fase) e depois na prova oral (3ª fase) tirar nota máxima sendo o candidato direcionado para ser orientado por um professor que compõe parte da chefia do processo seletivo? Na lista de resultado final das fases de seleção não é mencionado o nome por escrito dos candidatos, somente o número de inscrição divulgado publicamente como consta a seguir:

Trecho do resultado verificado, cada avaliação vale 50 pontos -

Resultado de três candidatos aprovados para a professora orientadora que compõe a banca de recursos de resultados :

1 - M331 Ampla concorrência - 46 pontos (2ª fase)

M331 Ampla concorrência - 49 pontos (3ª fase)

2 - M390 Ampla concorrência - 39 pontos (2ª fase)

M390 Ampla concorrência – 50 pontos (3ª fase)

3 - M153 Ampla concorrência – 36 pontos (2ª fase)

M153 Ampla concorrência – 45 pontos (3ª fase)

Resultado de dois candidatos aprovados para a professora orientadora que ajudou na aplicação das provas discursivas e que compõe o corpo docente:

1 - M483 Ampla concorrência - 46 pontos (2ª fase)

M483 Ampla concorrência - 50 pontos (3ª fase) Nota máxima.

2 - M258 Ampla concorrência - 40 pontos (2ª fase)

M258 Reserva de vagas - 50 pontos (3ª fase) Nota máxima.

Resultado de um dos candidatos aprovados para a professora orientadora que ajudou a chefiar uma das provas orais :

1 - M085 Ampla concorrência – 36 pontos (2ª fase)

M085 Ampla concorrência - 50 pontos (3ª fase) Nota máxima

Eu sugeri à universidade que , a partir de 2017 abrisse dois editais para cada processo seletivo de mestrado, um para alunos e professores convidados e recomendados e outro para candidatos externos em ampla concorrência. Não recebi resposta formal à minha sugestão.

Através desta matéria que redijo sugiro que o MEC e a Capes realizem fiscalizações mais constantes nos processos seletivos para pós-graduações em universidades públicas a fim de evitar o visível apadrinhamento de determinados candidatos e que repense o modelo de seleção para esses cursos no Brasil, no caso explanado acima seria necessário à CAPES rever todas as provas e notas aplicadas neste ano de 2016.

Assim como é utilizado o atual SiSU para a seleção das graduações em universidades públicas, o MEC deveria elaborar um sistema universal e mais justo para selecionar estudantes para cursos de mestrado e doutorado. Para selecionar mestrandos e doutorandos deveria existir uma prova objetiva universal a ser aplicada pelo MEC ou pela CAPES em nível regional e nacional para selecionar candidatos a cursos de mestrado e doutorado respeitando a isonomia e a igualdade de concorrência, essa prova objetiva universal não seria organizada diretamente pelas universidades, seriam organizadas e aplicadas pelo MEC e pela CAPES e o resultado certificaria o estudante por dois anos a se candidatar a um ou dois cursos de especialização, mestrado e doutorado numa instituição pública de ensino superior em qualquer região do Brasil, dependendo de sua nota final, o candidato seria avaliado em segunda fase dentro da universidade a partir da análise de seu pré-projeto avaliado por uma banca mista composta por dois professores internos da universidade e três professores de outras universidades indicadas pelo MEC e pela CAPES, dessa forma teríamos processos seletivos mais transparentes, mais coesos e consoantes com o esforço dedicado pelo estudante que sonha em desenvolver uma pesquisa e se tornar num mestre ou doutor no Brasil. Pois, muita gente boa está ficando de fora, devido ao método passional dependente da decisão do professor orientador e da comissão de seleção que decide quem entra e quem não entra no curso independente das capacidades demonstradas pelos candidatos.

Outros casos de apadrinhamento ou de seleção duvidosa para cursos de mestrado já foram denunciados no Brasil, veja:

http://www.jornalopcao.com.br/posts/reportagens/candidatos-denunciam-apadrinhamento-em-mestrado-da-facomb

*Fernando Rebouças é publicitário, jornalista, desenhista independente e membro da ABI-Inter (Associação Brasileira Internacional de Imprensa).