Refugiados ficam presos numa geografia do ódio - Editorial

Por Marisa Arruda Barbosa

atentados-em-paris - REUTERS

Em poucos dias, os ataques terroristas de Paris conseguiram abranger tantos assuntos que vemos o quanto a comunicação está cada vez mais acelerada. Em questões de horas, mesmo antes de o Estado Islâmico se responsabilizar pelos ataques, as sentenças já estavam distribuídas. Dentro de horas, o panorama político e cultural mudou não só em Paris, como nos Estados Unidos e outros países.

Até mesmo o governador da Flórida, assim como pelo menos a metade dos estados do país, já declararam que não querem ser o destino de refugiados sírios. Essa mobilização ocorre antes que autoridades confirmem se o passaporte de refugiado encontrado ao lado do corpo de um dos terroristas era verdadeiro. Até o momento, acredita-se que todos – ou a grande maioria – dos terroristas envolvidos no ataque eram cidadãos europeus.

Ou seja, se proteger-se significa fechar as portas, os EUA teriam que revisar o Visa Waiver Program, programa que isenta de visto vários países, incluindo europeus. Afinal, o que está confirmado até agora é que a maioria dos terroristas eram cidadãos europeus.

A discussão da semana é: temos que dizer não aos refugiados como forma de proteção.

Como disse o editorial do Miami Herald do dia 18, a questão frente aos ataques de Paris e a novas ameaças é que os governantes eleitos encarem o desafio atual, mas sem colocar em risco os nossos próprios valores, entre os quais está o de estender a mão para vítimas de desastres em grande escala.

Essa mensagem é de especial importância aos candidatos presidenciais, que antes mesmo de Paris contabilizar o número de mortos e feridos, já criticavam Barack Obama por não implementar planos para acabar com o Estado Islâmico ou mesmo perderam a oportunidade de se calarem. O republicano Jeb Bush, por exemplo, chegou a dizer que deveríamos dar prioridade a refugiados sírios cristãos. Sofrendo críticas, ele mais tarde disse que dar prioridade aos cristãos não exclui os muçulmanos.

Ainda de acordo com o Miami Herald, os EUA receberam dois mil refugiados sírios nos últimos quatro anos por causa de um processo de verificação estrito, comparando com um milhão que a Alemanha deverá receber este ano somente. O presidente Barack Obama pretende receber 10 mil refugiados no ano que vem, apenas 1% do total da Alemanha. Ou seja, tudo leva a crer que o processo de investigação dos refugiados é rígido o suficiente para que americanos sintam-se seguros.

Não foi só a direita dos EUA que teve uma crise xenofóbica após os ataques de Paris. No dia 16, e a três semanas das eleições regionais francesas, a líder de extrema-direita Marine Le Pen, da Frente Nacional (FN), exigiu a “suspensão imediata” da entrada de “novos imigrantes” na França. O premier da Hungria, Viktor Orbán, afirmou no Parlamento que é contra a política de cotas aprovada pela UE, que prevê o acolhimento de 120 mil refugiados das regiões de conflito no Oriente Médio, principalmente sírios. Já a Polônia avisou que não aceitará mais a imposição de cotas. Na Alemanha, o partido anti-imigração Pegida fez uma manifestação contra a entrada de refugiados no continente.

Como disse o editorial de O Globo, no dia 18, os refugiados sírios, “presos numa geografia do ódio, não têm para onde ir. Confundidos com terroristas, perversamente também pagam o preço do extremismo. E a opção entre aceitá-los ou rejeitá-los põe em jogo os princípios civilizatórios do Ocidente”. Vendo tal reação, o presidente Obama afirmou que fechar as fronteiras aos refugiados seria uma “traição aos nossos valores” e que “nossos países podem acolher os que buscam desesperadamente segurança, e garantir nossa própria segurança”.