Residente legal x Imigrante ilegal

Por Gazeta Admininstrator

Sem dúvida um dos assuntos mais importante para a comunidade brasileira em 2005 foi o “cerco” que veio se fechando em torno dos imigrantes indocumentados, especialmente aqueles chegados depois de 2001 e que não contam com nenhum tipo de amparo, o mínimo que seja, como por exemplo a i145, instrumento que tem dado uma certa “sensação de transitoriedade” a centenas de milhares de brasileiros que já estavam anteriormente aqui em território norte-americano.

Longe de ser “esquecido”, como muitos sugeririam, devido às catástrofes mundiais e violência impregnada em todos os cantos do planeta, em muitos aspectos 2005 é um ano para ser tomado como aprendizado.

Engraçado. A gente não cansa de ouvir frases e lemas como “é no sofrimento que se cresce” ou “é vivenciando as dificuldades que se aprende as lições mais importantes da vida”, mas quando se trata de analisar um ano realmente atipicamente cruel como foi o passado, as pessoas querem mesmo é “esquecer”. Infelizmente, que acha que só o sofrimento estabelece uma boa plataforma para crescimento, é quem me parece ter razão.

No seio da comunidade brasileira, a questão dos ilegais é de longe a mais importante e, explico claramente porque penso assim.
O desenvolvimento e progresso da comunidade brasileira neste país, hoje estimada pelos mais importantes órgãos governamentais dos dois países, em cerca de 1,5 milhão de pessoas, depende fundamentalmente da evolução dessa população para uma condição estável. É a confiança num futuro de legalidade nos Estados Unidos que fornece o combustível fundamental para que os imigrantes brasileiros indocumentados mantenham a fé no “sonho americano”, se empenhem em trabalhar mais, pagar impostos, se articular social e politicamente.

A comunidade brasileira nos Estados Unidos era quase “invisível” até começo dos anos 90. O núcleo histórico de Boston, os profissionais radicados em New York e os donos de loja de Miami representavam o que era palpável dessa presença. Curiosamente foi a Copa de 94, aqui realizada, que começou a mostrar, nos estádios e nas ruas, que haviam muito mais do que torcedores visitantes brasileiros nas cidades norte-americanas.

Hoje a situação é muito diferente. Os brasileiros se tornaram “visíveis” por bons motivos e por outros nem tanto.
Com a explosão da imigração brasileira entre 1986 e 2000, nossa visibilidade em regiões como Boston, New York, Sul da Flórida, New Jersey, Atlanta, Los Angeles e Orlando, se tornou muito mais evidente. Passamos a representar um fluxo novo de imigração, parte dele de classe média e com bom nível escolar, “fugindo” de um Brasil violento e instável economicamente. Em busca de segurança (alguns) ou simplesmente uma sobrevivência básica e digna (a maioria).

A “terceira onda” começou em 2000 e segue até os dias de hoje. Uma onde o fluxo dos imigrantes brasileiros passa a ter um perfil drásticamente segmentado: os atravessadores da fronteira. Filhos do endurecimento na concessão dos vistos (política que começou já em 97) e alvos da “síndrome de pânico anti-imigrante” que tomou conta da bélica sociedade norte-americana, imediatamente após os ataques terroristas de 11 de Setembro de 2001.

Em 2004 começou a “quarta onda”, essa interna e muito perigosa porque presumivelmente divide os brasileiros entre os que estão aqui residindo legalmente e uma maioria de indocumentados. Surgiu o preconceito , cada vez mais evidente, do brasileiro residente contra “certo tipo de imigrante ilegal”.

Antes de mergulhar apaixonadamente nessa questão, devo apenas lembrar que muitas das “queixas” dos brasileiros residentes legais ou em processo de legalização, são fundamentadas nos prejuízos, individuais e coletivos, que creem estariam os “atravessadores de fronteira” causando à imagem da comunidade brasileira como um todo.
Culpar os imigrantes que atravessam fronteiras é um erro grosseiro. Ajuda apenas a certo setor extremista e ultra-nacionalista norte-americano que, me perdoem, não enxerga um palco adiante do nariz e usa, de forma às vezes cruel, irresponsável e mentirosa, a “desculpa” de que são os imigrantes ilegais que estariam corroendo os valores e a estabilidade dos Estados Unidos.

Ninguém aqui vai fazer apologia de nenhum ato ilegal. Mas a questão humana da Imigração é muito mais complexa e histórica, remontando os primórdios da raça humana e não avança se for analisada como vem fazendo os defensores dos “muros da vergonha”.

O mundo livre chorou de júbilo com a queda do Muro de Berlim, e um dos maiores responsáveis por essa queda foi o ex-presidente Ronald Reagan (Republicano).

Agora, são os setores mais ultra-direitistas do país que defendem a construção de um “Muro” semelhante na fronteira dos Estados Unidos com o México.

No ano passado assistimos, com muita tristeza e preocupação, lideranças brasileiras, sabe lá em defesa de que tipo de interesses seria, se voltarem publicamente contra os ilegais brasileiros. Fiz um editorial a respeito desses lamentáveis episódios ocorridos nos estados de Connecticut, Massachusetts e New Jersey . Recebí muitas manifestações de apoio e solidariedade, mas recebí também, não sem surpresa, quatro manifestações que, em graus variados de “apoio” à discriminação.

Se antes atitudes de brasileiros contra brasileiros dentro de uma comunidade “inexistente’ já seriam condenáveis. No mínimo, antipáticas. Hoje, são atitudes que ferem os interesses coletivos de uma comunidade que já tem um expressivo quinhão “não-transitório”.
Basta lembrar como a comunidade cubana de Miami recebeu os “Balseiros”. Na década de 80, como forma de “aterrorizar” o governo norte-americano, Fidel Castro “liberou” quem quisesse deixar a ilha comunista para buscar asilo nos Estados Unidos. Mas “liberou” apenas cidadãos que, no ponto de vista do sistema cubano, eram “marginais, párias, elementos inúteis ao regime”. Era o “prato perfeiro” para gerar uma grande animosidade de cubanos contra cubanos em Miami. E, de fato, houve em setores do exílio reações semelhantes a essas que se pressente na comunidade brasileira.

Mas durou pouco, muito pouco. O exílio cubano, que é mestre na arte de defender seus interesses e têm uma força política muito maior que a dos mexicanos (embora nos Estados Unidos sejam 3 milhões de cubanos contra 30 milhões de mexicanos), rapidamente acolheu os “Balseiros” (por terem saído de Cuba em balsas) e os incorporou.
A população cubana aumentou e conseqüentemente o peso político e suas conquistas.

Que sirva de exemplo a todo e qualquer brasileiro residente que tem a ilusão de que é melhor ou tem direito mais legítimo de estar aqui.