Ser mulheres

Por Adriana Tanese Nogueira

Ser Mulher, escreveu Oriana Fallaci, a mais famosa jornalista italiana e escritora reconhecida, é tão fascinante. É uma aventura que requer tamanha coragem, um desafio que não termina nunca. Mulheres criadoras de pessoas, de ideias, de projetos, de sonhos. Mulheres que buscam sua identidade, que conversam, desabafam, brigam e choram. Mulheres que criam filhos sozinhas. Mulher que lutam por relações impossíveis, que acreditam, torcem, estão focadas. Mulheres, esteio moral, afetivo e emocional. Mulheres que agregam e mantêm junto. Mulheres que aguentam o inimaginável por seus filhos. Mulheres que ganham coragem inimaginável por seus filhos. Mulheres tão pouco compreendidas até por elas mesmas. Freud em seu Três Ensaios sobre a Sexualidade se perguntava a respeito da feminina inveja do pênis. O que as mulheres queriam afinal? Jung em sua autobiografia, Recordações, Sonhos e Reflexões refletia sobre o significado da trindade feminina representada em mitologia e na simbologia das três luas, do ciclo lunar, das deusas. Homens tentando entender o feminino. Numa sociedade na qual quem tem poder social, de escolha e de autonomia são homens, os que têm um pênis, é inevitável que quem queira liberdade de escolher e fazer sinta inveja deles. Mas não é só isso. A inveja do pênis reflete o desejo feminino por um pensamento próprio, original e leal para com sua vivência. A mulher tem sido pensada, apreciada, admirada ou julgada, raramente se pensou. O símbolo fálico representa o Logos, a função pensamento. Invejá-la representa o desejo inconfessado de ser sujeito ativo, protagonista de sua vida, criadora de nova cultura, conhecimento, interpretações do que é ser humanos e estar vivos. O masculino das mulheres, chamado por Jung de animus, reproduz ao seu estado natural a cultura coletiva na qual a mulher foi criada. Ele repete o pensamento do grupo. Não é produção original dela. E isso porque a função principal da mulher tem sido a do Eros (Jung), que é a função de relação. As mulheres têm posto mais ênfase em se relacionar e em criar relações do que em pensar essas relações, refleti-las, questioná-las, muda-las, transformá-las a partir de suas necessidades mais profundas. Elas chamam ainda hoje isso de “egoísmo”. O pensamento feminino, assim, tem servido para justificar as relações. Quando a mulher foca seu pensamento na manutenção das relações, ela não pode venturar-se por novos caminhos e, sobretudo, ela não está consigo. A relação com o outro é prioridade. Afinal, a ela tem sido delegado o papel de ser esteio da sociedade, da família e da relação de casal. Se ela não estiver ativamente dedicada a fazer essas redes de vínculos funcionarem ela pode quebra. Nessa tarefa, muitas vezes exaustiva, as mulheres passam boa parte de suas vidas. Cresce o número de mulheres que estão esgotadas, sentem-se vazias e desconectadas de si. Seu desafio é: amar a si e ao outro igualmente. Desafio que nunca poderão solucionar de verdade sem incluir a si mesmas nas relações. Incluir o todo de si mesmas, não um pedaço. Ou seja, esse é o desafio feminino que irá abrir uma nova forma de amar e um novo modelo de relação. A sociedade está sedenta por esta mudança. Na carne muda está presa a voz das mulheres. Na matéria diária de palavras não ditas, olhares disfarçados, silêncios lotados, olhar sério e paciente, sorrisos para esconder a dor, sacrifícios inúmeros e regaço sempre disponível está o embrião do pensamento feminino que precisa nascer graças àquelas mulheres que se derem ao trabalho de olhar para dentro de si. Pausar o mundo. Pausar a necessidade de atender ao pedido do outro. Enxergar-se. Ouvir-se. Perceber-se. Sem culpa. Conhecer-se. Aprender a se respeitar.