Significados do comer - Viver Bem

Por Adriana Tanese Nogueira

Comer não significa simplesmente botar nutrimento físico para saciar a necessidade do corpo físico. É bem mais do que isso, motivo pelo qual a relação com a comida pode ser tão complicada.

Nosso primeiro alimento é nossa mãe. A vida biológica está programada de modo que todo bebê mamífero está predisposto a procurar um bico de peito de onde sugar o alimento indispensável para sua sobrevivência. Isso é biologia – mas não só.

Desde o início há outras questões envolvidas. Não mamamos somente o leite materno, mamamos também as emoções, crenças, estado de espírito, problemas de nossa mãe. A mãe é nosso primeiro mundo, algo externo que nos nutre não só no corpo como na alma. Qual será nosso segundo mundo? O ambiente familiar, depois aquele coletivo e, enfim, aquele social. Quando nos anos seguintes ingurgitarmos alimento, estaremos atiçando não só as papilas degustativas, mas todos os sentidos ligados à nutrição que é física, emocional, intelectual e espiritual. O alimento físico fortalece o corpo físico, mas o alimento emocional, intelectual e espiritual dá força moral, acolhimento, autoestima, dignidade, consideração, respeito, valor próprio, etc.

A partir dessa grade de compreensão, tentemos analisar alguns dos distúrbios alimentares mais frequentes: Comer demais Abarrotar-se de comida significa preencher um vazio interior. É apostar que a quantidade possa substituir a qualidade. Obviamente, como não é de alimento material que precisamos, cria-se um círculo vicioso porque o vazio nunca é realmente preenchido, apesar da quantidade de comida que botamos para dentro. Comer demais também representa uma forma de “fortalecer-se” para enfrentar o mundo. Quando nos sentimos frágeis, pequenos, indefesos e vulneráveis, ter um corpo grandão pode dar a sensação de proteção e poder. Por dentro do obeso, portanto, pode se esconder uma criança confusa e assustada. Em ambos os casos vemos aqui a metáfora da comida que preenche e fortalece, mas dentro de um mal entendido: o que de fato se está buscando é preencher um vazio interior (não do estômago) e fortalecer uma psique fragilizada (não um corpo frágil). Comer de menos Esta atitude é mais comum nos introvertidos tanto quanto a anterior o é nos extrovertidos. Comer pouco equivale a ingurgitar o mundo com muita cautela porque, sabemos, o mundo não é um lugar seguro. Logo, é preciso tomar cuidado com o que pegamos de fora para levar para dentro.

Por “mundo” se entende aqui desde a primeira relação com a mãe e a família até a sociedade. Mas a relação com a família tem um peso porque é através dela que aprendemos a lidar com o mundo mais amplo; é a família que haveria de nos dar estrutura emocional e intelectual para encararmos e nos estabelecermos nesse mundo. Agora, é bom lembrar que a responsabilidade não cai só sobre a mãe, mas também sobre o pai e a família mais alargada, que inclui avós, tios e primos, dependendo da história de vida de cada um. Ser difíceis para comer Esta é uma característica típica das crianças. Elas estão na fase de adaptação ao mundo e estão assim tentando selecionar as partes de mundo que querem e as que não querem. Obviamente não é excluindo o espinafre que resolverão seu problema, assim como não é comendo dois pratos de feijoada que teremos forças para enfrentar os nossos problemas existenciais. Mas, assim funciona nossa psique. O físico e o psicológico se sobrepõem, sempre. Quanto menos o lado psicológico é compreendido, mais o problema se torna físico e, portanto, para resolvê-lo é preciso recuar até sua origem e seu significado simbólico para então desatar o nó e livrar a pessoa de um sintoma que só a prejudica.