Sobrevivente brasileira na luta contra o Câncer

Por Marisa Arruda Barbosa

A mensagem do falecido Steve Jobs para formandos da Universidade de Stanford em junho de 2005, postada no YouTube.com, foi compartilhada inúmeras vezes depois de sua morte, causada por um câncer, no dia 5. Ela inspirou não só recém-formados, mas pelo menos quase 11 milhões de pessoas que assitiram o vídeo na internet.

“Quando eu tinha 17 anos, eu li uma frase que dizia: ‘Se você viver cada dia como se fosse o seu último, um dia você estará certo’. Isso me causou um impacto, e desde então, nos últimos 33 anos, eu olho no espelho e me pergunto: ‘Se hoje fosse o meu último dia, eu gostaria de estar fazendo o que estou fazendo?’ Se a resposta fosse ‘não’ por alguns dias, eu sabia que era a hora de mudar”, disse Jobs, co-criador da Apple, e pai de produtos como o Macintosh, o iPod, o iPhone e o iPad, no discurso.

O significado da morte de Jobs torna-se ainda mais peculiar para o mundo, que parou por dias prestando homenagens ao homem que revolucionou a comunicação, pelo fato de ter ocorrido no mês de conscientização do câncer de mama nos Estados Unidos.

A brasileira Jane Maria Piazzetta, natural de Bento Gonçalves, no Rio Grande do Sul, mais conhecida como Janinha entre a comunidade brasileira de Miami, exalta a inspiração que o discurso lhe traz: “Com certeza, a existência do ser com câncer ou sobrevivente refletiu muito no que Steve Jobs falou no discurso. Só uma pessoa com câncer e sem saber do status ‘sobrevivência’ fala essas coisas.”

Janinha é sobrevivente de câncer de mama e reconheceu que a incerteza da sobrevivência é algo que mudou a sua vida, a vida de Jobs, e das pessoas que procuram por sua ajuda através da organização sem fins lucrativos que fundou, o H3: Health.Hope.Healing. “Quem passou por um câncer aprende a viver o presente intensamente.”

Uma imigrante que teve a vida mudada pelo câncer

Janinha descobriu que tinha câncer em outubro de 2004. Era estudante de mestrado em tempo integral em Miami, e faltavam somente dois semestres para que ela se formasse. Tudo mudou: a incerteza da sobrevivência, sozinha, sem trabalho, pois estudava tempo integral, e sem seguro de saúde.

Depois de dias de solidão e angústia, ao mesmo tempo que o corpo ia mudando, Janinha constatou que só lhe restava ir à luta, uma vez que mal tinha família para correr de volta para o Brasil.

Janinha tem uma longa história de câncer na família: perdeu seu pai, sua mãe, sua tia, irmão, sobrinho e muitos amigos para a doença. Mas conta que o que realmente a tocou foi a morte de seu irmão, aos 55 anos.

“Quando você vê alguém de sua geração indo embora, isso te faz pensar que você pode ser o próximo”, conta. Janinha fez o teste genético, que deu negativo, mas conta que foi logo depois da morte de seu irmão que ela foi diagnosticada com um tumor de 5 cm no seio esquerdo, aos 41 anos. “Por ter histórico na família, eu fazia exames desde os 28 anos de idade”, conta a gaúcha, que vive nos Estados Unidos há 30 anos.

Sua grande vitória foi no dia em que descobriu que estava em remissão, ou seja, sem câncer. Sua última quimioterapia foi em 2005. “Só que aí começou a luta pela sobrevivência, pois foram muitos os efeitos colaterais.” Um dos efeitos foi um problema de tiroide e a luta constante contra o excesso de peso.

O recomeço e a ideia do H3

A hora de voltar à vida normal é mais um desafio do sobrevivente de câncer, segundo conta Janinha, mostrando sua carteira de motorista, que mostra a foto dela com um cabelo cheio, cacheado, que nunca mais recuperou. “Quando as pessoas veem minha carteira de motorista, não me reconhecem.”

Perdida e sem saber como lidar com os efeitos colaterais, Janinha constatou que a solidão não é só durante o tratamento e a descoberta do câncer, mas também depois. “Eu estava mal, precisando de ajuda, mas nesse sistema aqui, quando você liga para o médico, ninguém atende”, conta. “Se tem uma amergência você tem que ligar para o 911 e pronto.”

Ela foi, desde o início, entrando nas curas alternativas. “Me conectei muito espiritualmente, fiz, em paralelo ao tratamento, o BodyTalk, uma maneira de cura natural, e também tratamento com enzimas com um quiroprata.”

Foi em agosto de 2007 que fez o primeiro evento do H3, depois de mais ou menos um ano sem câncer. Sua ideia era de criar, na época, um grupo de apoio a pessoas com câncer de mama, através do Breast Cancer Fundation.

Como funciona o H3

O Breast Cancer Fundation funciona sob o H3, um grupo educacional que reúne especialistas de diversas áreas, periodicamente, para apresentar estudos relacionados ao câncer. Apesar de ter como principal foco o câncer de mama, o grupo lida com outras formas da doença e inclusive pessoas que nunca tiveram câncer. “Cerca de ¾ da nossa database é de pessoas que nunca tiveram câncer, mas que aplicam métodos de prevenção no seu dia-a-dia.”

Os encontros são gratuitos no Miami Beach Regional Library (227 22nd St, 33139, Miami Beach), que apoiou o projeto desde o início, mas também acontecem em diferentes lugares. A escolha dos convidados para palestras é exigente: “Sei que o H3 tem responsabilidade com a comunidade, por isso escolho muito e tenho que rejeitar muita gente”, conta. Entre os especialistas estão a sexóloga Marilyn K. Volker, que fala sobre a sexualidade entre sobreviventes de câncer, algo pouco discutido, e a radiologista brasileira Nilza Kallos, entre muitos outros.

Janinha tem agendado reuniões com o prefeito de Miami Beach e, pouco a pouco, caminha para a realização do sonho de tornar os eventos do H3 parte da agenda da cidade, com o apoio do governo. A partir daí, sua intenção é, através de subsídios do governo, trabalhar com comunidades mais pobres, que não imaginam como a nutrição pode prevenir doenças.

Envolvendo a comunidade brasileira

O foco de Janinha neste mês de prevenção do câncer de mama é envolver a comunidade brasileira com a causa. Ela recebe o apoio de muitos amigos, como Rose Max e o maestro Ney Rosauro, mas sente que o alcance do H3 deve ser ainda maior.

Ela diz que orienta com frequência pessoas que acabam de receber um diagnóstico de câncer. Um caso recente foi o músico brasileiro Rogério de Moura, diagnosticado no ano passado com um Linfoma de Hodgkins. Muitos amigos começaram a arrecadar dinheiro na época. Janinha conta que não o conhecia pessoalmente, mas ao ver as discussões sobre a campanha, resolveu ajudá-lo e conseguiu que Rogério fizesse sessões de radioterapia no St. Mary’s Medical Center, no Kaplan Cancer Center.

De acordo com Janinha, imigrantes indocumentados não devem ter medo de buscar ajuda hospitalar ao serem diagnosticados. Mas afirma que é necessário buscar ajuda no condado de residência, onde deve ser comprovado que vive há pelo menos um ano. “Sei que o procedimento é frustrante, tem que fazer muitos telefonemas, mas tem que ser persistente para conseguir ajuda”.

Para saber mais do H3, acesse o site: www.h3hope.org , e-mail: info@h3hope.org. Telefone: (305) 531-2040.

Eventos para a comunidade brasileira

Janinha está promovendo, no dia 22, das 6 às 8pm, um evento no Restaurante Boteco (916 NE 79th Street, Miami, FL – 33138. Telefone: (305) 757-7735 com convidados especiais para falar sobre o tema.

No dia 20 a loja Kariza (1630 Jefferson Ave, Miami Beach 33139), promoverá um evento em que convidados oferecerão serviços e educarão os presentes sobre como ser mais saudável e prevenir a doença. O evento será das 6 às 7pm.