Um Brasil, ainda, de muita desigualdade - Editorial

Por Carlos Borges

Sem pretender negar o óbvio: as políticas econômicas em sequência dos oito anos de governo FHC, oito anos de Lula e este primeiro ano de Dilma Rousseff, resgataram cerca de 30 milhões de brasileiros para a sociedade de consumo e livraram da fome e miséria absoluta uma gigantesca parcela da população.

Mas não é preciso ser cientista e muito menos se municiar de estatísticas para reconhecer que o Brasil entra em 2012 como um dos países que segue exibindo um dos mais dramáticos “abismos” sociais do planeta.

Segundo dados divulgados esta semana pelo IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – órgão oficial do governo, mas que tem uma longa e respeitável tradição de autonomia e independência, um quarto, ou sejam 25% de toda a geração de renda do Brasil está concentrada em apenas cinco municípios: São Paulo (12%), Rio de Janeiro (5,4%), Brasília (4,1%), Curitiba (1,4%) e Belo Horizonte (1,4%). Em contrapartida, estas cinco capitais representam apenas 12,6% da população nacional.

É um dado incômodo e que emergiu da pesquisa que avaliou o PIB (Produto Interno Bruto) dos municípios brasileiros em 2009. Os dados são de 2009, mas foram divulgados somente agora.

Mesmo tendo sido priorizada pelos 9 anos de governo petista, as 5 maiores capitais da Região Nordeste do Brasil – Salvador, Fortaleza, Recife, Natal e Maceió – representam, juntas, menos de 3% da geração de renda do país. Salvador, por exemplo, a terceira maior cidade do Brasil, ficaria abaixo das 15 cidades maiores geradoras de renda no país, atrás até de cidades do interior de São Paulo, como Campinas e Ribeirão Preto.

O que isso traduz é a consciência de que, se finalmente podemos dizer que o Brasil marcha decididamente para deixar de ser “subdesenvolvido” para se alinhar entre as maiores economias do planeta, essa “pujança” econômica ainda está muito longe de se traduzir em menor desigualdade social. E as infinitas distâncias de inserção econômica e qualidade de vida que sempre separaram as regiões Sul, Nordeste e Norte do Brasil, seguem, infelizmente, quase no mesmo patamar de 30, 40 anos atrás.

O problema é que, para alavancar de vez o crescimento do país, uma maior homogeneidade é imperativa. Estamos longe de vermos integrados de forma mais equânime os mercados produtores e consumidores das diversas regiões do país. Os reflexos são enorme desequílibrio nos níveis salariais, taxa de consumo individual e inúmeros outros indicadores econômicos e sociais.

A pesquisa divulgada pelo IBGE traz ainda números curiosos, interessantes, que ora reforçam a constatação do “salto” dado pelo Brasil pós 1995.

Considerando-se o ranking de participação de todos os municípios do país no PIB, os maiores ganhos de posição de 2008 para 2009 ocorreram nos municípios paulistas de Monções (da posição 4.502 para a posição 1.818), Brejo Alegre (de 4.334 para 2.373) e Borá (de 5.037 para 3.679), todos com crescimento relacionado à produção de açúcar e álcool.

Já as maiores perdas de posição foram nos municípios mineiros de Albertina (da posição 3.554 para 5.162) por causa da queda do comércio atacadista do café em grão, Catas Altas (de 1.423 para 3.018), pela queda no valor da produção do minério de ferro (que já vinha caindo desde 2005, mas se agravou com a crise, provocando o fechamento de algumas minas), e Prudente de Morais (de 2.488 para 3.645) pela queda expressiva na produção de cal e gesso, além do encerramento das atividades de empresa ligada à produção de ferro-gusa.

Curiosamente, quem lidera o ranking entre os municípios com maior PIB per capita em 2009, é uma cidade do Recôncavo baiano, a menos de 120 km de Salvador: São Francisco do Conde (BA), que tem como característica comum a baixa densidade demográfica. A cidade do interior baiano abriga a segunda maior refinaria em capacidade instalada de refino do país com PIB per capita de R$ 360.815,83 e uma população de apenas 31.699 pessoas.

Em 2º lugar, Porto Real (RJ), com R$ 215.506,46 e 16.253 habitantes, cujo PIB per capita foi bastante influenciado pela indústria automobilística. Triunfo (RS), sede de um importante polo petroquímico na região metropolitana de Porto Alegre, ficou em 3º lugar com R$ 211.964,79 e 25.374 habitantes.

Afora estes dados curiosos, o verdadeiro sentido “alarmante” desta pesquisa do IBGE é abrir os olhos de quem vive estufando o peito e propagando aquele “patriotismo de ocasião”, dando conta que o Brasil “já é” isso ou aquilo.

Temos tudo para chegar lá, para estarmos muito brevemente aos níveis de menores desigualdes regionais. Mesmo países desenvolvidos como França, Itália, Japão, Estados Unidos, sem falar nos nossos “parceiros emergentes”, China, Rússia e Índia, convivem com graus diversos de desigualdade social dentro das regiões de cada país. Os exemplos de China e Índia são ainda mais radicalmente negativos do que o Brasil.

Mas em vez de lidar com o “consolo” dos que estão piores do que nós, temos mesmo é que trabalhar duro para nos alinharmos com que está à nossa frente.