Bianca estava com tem sete meses e havia a pouco começado a ficar sentada sozinha. Aos oito, ela ainda não engatinhava. A mãe observava, um pouco preocupada, mas muita coisa estava acontecendo e, vendo Bianca alegre, considerou que tudo estava bem. Cada bebê com o seu tempo.
Um dia comprou um daqueles tapetes coloridos feito de peças para montar, como um quebra-cabeça, com os números e as letras do alfabeto. O armou na sala, na frente do sofá, e lá colocou a pequena Bianca, sentada com um pote de brinquedos coloridos para explorar. Enquanto fazia as atividades domésticas, mantinha um olho na filha.
Bianca ficou entretida por um bom tempo, ocupou-se, divertiu-se e observava a mãe – sem nunca sair dos limites do tapete.
A mãe de Bianca olhava sorrindo, mas também um pouco perplexa. Deixou o tempo passar. Cada criança precisa ser olhada como uma peça única da humanidade e não comparada a ninguém mais, nem mesmo a si próprias, pois a mãe de Bianca havia começado a andar aos nove meses...
Bianca só foi andar com um ano e quatro meses, andar sozinha, de verdade, completamente autônoma. Sua mãe teve de exercer verdadeiro controle sobre sua própria ansiedade, mantendo as expectativas o mais longe possível da filha que tinha o sagrado direito de seguir seus ritmos internos.
Como explicar a grande diferença entre mãe e filha? Se olharmos somente para Bianca, as más línguas podem dizer: bebê preguiçosa ou fraca... No lugar dessa visão míope e reducionista, vamos ser mais fiéis à realidade e ampliar o foco de visão.
Cada bebê tem sua personalidade, que se mostra desde o início de sua vida. Mas, esta personalidade vai expressar certas características ou não na relação com o ambiente. E por ambiente entendendo desde a vida intrauterina até o ambiente físico, no qual um indivíduo nasce.
Dentro da barriga da mãe, Bianca presenciou às agressões do pai contra a mãe, ou seja, contra ela, pois nesse momento mãe e feto são uma coisa só. O pai de Bianca é alcoólatra, o que significa que ele está sujeito a ter ataques de agressividade e a estimular conflitos e brigas de forma periódica e constante, sem precisar de nenhum real motivo. Assim funciona com todo dependente de drogas.
A mãe de Bianca nunca se submeteu aos atentados do marido, mas o clima de tensão e de possíveis atritos tornaram a vida muito complicada e o estado emocional dela sempre no alerta. O nascimento de Bianca foi um dos poucos momentos de harmonia do casal, mas o depois voltou à condição de campo minado.
Logo, o ambiente no qual Bianca nasceu não era seguro.
O que faz uma criatura viva diante de um ambiente inseguro? Foge se possível, mas se não for possível, para. É cautelosa e observa para entender o que é que está acontecendo. Somente quando tiver dados suficientes que permitam a segurança, ela se mexe. Num terreno minado precisa pelo menos ter uma intuição de para qual lado ir para evitar o pior, certo?
Tudo diferente do que viveu a mãe de Bianca que nasceu de um casal tranquilo e pacífico, sem brigas, sem conflitos e num lugar muito sossegado. Nada ameaçava sua paz. Logo, ela pôde se lançar mais cedo na exploração do mundo.
Bianca só foi andar solta e autônoma após seis meses que sua mãe se separou de seu pai, após se estabilizarem num lugar tranquilo na proximidade de poucas, mas seguras companhias. Inclusive, o ambiente físico também mudou, da cidade caótica, barulhenta e poluída, foram para o interior, uma chácara verde com borboletas, gatos, cachorros, flores e passarinhos.