O bypass espiritual acontece quando a prática espiritual, no lugar de ajudar a integrar as limitações humanas, se torna um substituto para evitar enfrentar as questões psicológicas, relacionais ou concretas não resolvidas.
Agostino Famlonga
A religião, diz Ken Wilber, pensador e criador da Psicologia Integral, é “espiritualidade codificada”. Temos tantas religiões quantas formas de codificar a espiritualidade, dependendo do tempo histórico, da cultura e da realidade social dos grupos humanos que produzem uma certa religião. Como sabemos, ter uma espiritualidade não quer dizer aderir a uma religião. Há muitos caminhos para viver e desenvolver a espiritualidade tanto dentro das religiões como fora delas. E hoje, mais do que no passado, é possível encontrarmos opções criativas e inovadoras para descobrir a dimensão da espiritualidade. Entretanto, é preciso discernimento para que ao abraçar a espiritualidade não fujamos de nossa humanidade. Esta prática, muito difundida, é chamada de “Bypass Espiritual”. Bypass em inglês quer dizer contornar, desviar, evitar, buscar uma atalho. Um bypas espiritual ocorre quando a espiritualidade é buscada para evitar alguma outra coisa. Ela é usada como um mecanismo de defesa psicológico para desviar das questões atuais, pessoais e eminentemente psicológicas que nos perturbam. O bypass espiritual inibe o processo de crescimento tanto psicológico como verdadeiramente espiritual. Segundo o psicólogo Augusto Famlonga, tudo começa de uma sensação de carência e da busca por se sentir melhor e fazer algo para se sentir melhor. O passo seguinte é o de enveredar por um caminho interior de crescimento e de conscientização. Mas, nesta jornada a saída mais fácil é a de querer encontrar uma orientação de fora, que possa ter uma garantia soberana e absoluta, que possamos aplicar às nossas vidas sem necessariamente precisar investigar e explorar nossa interioridade. O caminho espiritual, assim, se perfila como o mais imediato. Esta é uma dinâmica comum e sutil, que permeia o comportamento de muitas pessoas bem-intencionadas e que por isso é difícil de reconhecer. Podemos definir o bypass espiritual como uma transcendência prematura: um querer se elevar acima de nossa humanidade, de nossa psicologia e de nossas questões íntimas e complexas, antes de ter integrado e conhecido esta mesma realidade interior. Portanto, o bypass espiritual corresponde ao uso, mais ou menos consciente, de ideias e práticas espirituais para evitar enfrentar os problemas psicológicos abertos, as questões emocionais não resolvidas, as feridas que não foram curadas e as etapas do desenvolvimento psico-social que não foram completadas. Este mecanismo pode ser observado por todo canto e se apresenta de muitas formas. Como sempre, conhecer o funcionamento dessas dinâmicas é o primeiro passo para ir além e abrir o caminho da própria evolução. A espiritualidade não pode ser reduzida a um “valium” metafísico-existencial. Espiritualidade não é para nos acalmar mas para nos impulsionar no caminho da evolução da consciência. Nesse sentido precisamos:- Evitar criar separações entre verdades consideradas absolutas e verdades relativas, vinculadas ao nosso momento concreto de vida.
- Evitar criar um ego que se sente o dono da razão e representante das verdades absolutas na terra, porque assim nos desumanizamos e perdemos contato com os demais humanos que formam nossa família terrena.
- Explorar nossos processos psicológicos com os meios adequados para que então possamos desenvolver uma espiritualidade autêntica.