Caracterizada por vilarejos do sertão baiano, formados por comunidades que convivem com a seca, onde a renda média não chega a um salário mínimo, a região de Monte Santo foi escolhida por uma quadrilha que há mais de cinco anos atua no tráfico de crianças. Mulheres dizem ter sido enganadas por agenciadores e nunca mais terem visto seus filhos. As informações são do “G1”.
A história dessas mães vítimas é a mesma do casal Silvânia e Gerôncio, que também moram na localidade, e que foi divulgada recentemente pelo “Fantástico”. Eles tiveram os cinco filhos tirados à força de casa e entregues para famílias em São Paulo.
Mães de famílias pobres, com pouca instrução, baixa ou nenhuma escolaridade, solteiras de preferência, são os alvos da quadrilha, segundo a Justiça. Uma das vítimas mora em uma casa na zona rural de Monte Santo.
Marivalda de Souza tem 25 anos, quatro filhos, sendo que apenas três moram com ela. Na última gravidez, concordou em dar a caçula para a adoção, sob a promessa de que sempre poderia rever a filha. “Ela falou bem assim: não se preocupe, nós vamos trazer sua filha”, disse. Mas a promessa não foi cumprida e há três anos Marivalda não vê a filha.
O Ministério Público da Bahia (MP-BA) destaca a ilegalidade dessas ações. “Foi feita a entrega das crianças pela família biológica, mas sem o necessário processo de adoção”, explica o promotor Luciano Ghignone.
Investigações
Há suspeitas de que as crianças foram levadas com documentos falsos. De acordo com as investigações, as falsificações podem ter sido feitas no fórum de Monte Santo. O atual juiz de Monte Santo, Luis Roberto Capio, não descarta uma infiltração da quadrilha no serviço público e por isso mandou fechar os cartórios de registro civil e da vara criminal. Ele tem receio de que as provas desapareçam ou sejam adulteradas. Duas mulheres que são apontadas pelas vítimas como pessoas que intermediaram o processo com as crianças negam participação no esquema.As investigações também indicam a participação do juiz Vítor Manoel Xavier Bizerra nos casos de Monte Santo. Ele teria mandado retirar à força, de dentro de casa, as crianças de Silvânia. E era ele o juiz da cidade quando as outras três mulheres perderam seus filhos.
O Conselho Nacional de Justiça orientou o Tribunal de Justiça da Bahia a investigar Vítor Bizerra. “A escala de punições que um juiz está sujeito é advertência, censura, disponibilidade e aposentadoria compulsória com vencimentos proporcionais”, diz o presidente do Tribunal de Justiça da Bahia, Mário Alberto Hirs. A CPI da Câmara Federal, que investiga o tráfico de pessoas, anunciou que vai apurar as denúncias.
A Secretaria dos Direitos Humanos, ligada à Presidência da República, identificou dez irregularidades praticadas pelo juiz Vítor Bizerra. A Polícia Federal e o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) também vão investigar a atuação do juiz que concedeu a adoção. A corregedoria na Bahia tem 60 dias para apresentar um relatório sobre a atuação de Bizerra. O juiz está atualmente na cidade de Barra, a mais de mil quilômetros de Monte Santo.
"Se ficar comprovado que houve má fé, erro por parte do magistrado, a corregedoria agirá com mão de ferro", afirmou o ministro Francisco Falcão, corregedor nacional de Justiça. Agora, o atual juiz de Monte Santo trabalha na revisão dos processos. Ele vai decidir se Gerôncio e Silvânia terão ou não os filhos de volta.