A onda de protestos e violência na Venezuela tem ecoado em manifestações em todo o sul da Flórida, dado o grande número de venezuelanos na região. Mas a brasileira Pietra Diwan não imaginava o quanto isso poderia influenciar em sua própria vida.
Pietra, de 39 anos, que vive em Doral, cidade que concentra grande parte da comunidade venezuelana, acompanhou, através de amigos, a indignação e preocupação dos imigrantes do país sul-americano no site de mídia social “Facebook”.
Mas quando postou um link que mostrava fotos de violência atribuídas à Venezuela, mas que na verdade teriam sido tiradas em outros países, seguido de um comentário para as pessoas tomarem cuidado com a manipulação, Pietra foi duramente criticada por venezuelanos contrários ao governo de Nicolás Maduro. A brasileira não se declara nem contra nem a favor do ex-presidente morto Hugo Chávez ou de seu sucessor, Maduro, mas mesmo assim ela e sua empresa foram acusadas de comunistas e sua vida virou um pesadelo no último mês.
Pietra é dona da atacadista de brigadeiros Samba Gourmet, aberta em 2013 e que hoje tem grandes clientes no sul da Flórida, como a rede de restaurantes Giraffas, algumas lojas da CVS, Walgreens e agora está lançando o produto no site Amazon.com.
Vivendo no sul da Flórida há sete anos desde que seu marido foi transferido pela empresa,
Pietra acabou deixando para trás sua carreira de historiadora. Ela havia publicado um livro no Brasil antes de vir para os Estados Unidos, fez o lançamento aqui também, mas aos poucos começou a se dedicar ao ramo alimentício. Mas, segundo brinca, ela não conseguiu deixar de lado seu espírito questionador de historiadora ao ver que muitos dos posts no Facebook atribuídos à Venezuela eram na verdade fotos tiradas na Síria, Egito e outros países que passaram por guerras recentes.
Pietra relata que quando chegou aos Estados Unidos ficou muito envolvida com a comunidade hispânica da região. Com uma filha pequena, envolveu-se em grupos de mães, fez amizades, frequentou casas e festas de aniversário. Mas de dois anos para cá, Pietra conta que se afastou um pouco desse grupo, por diferenças culturais e porque sua nova empresa consumia muito de seu tempo. “Mesmo assim, mantive contato com essas pessoas através do Facebook”, explica.
“Efeito viral”
Mas Pietra relata que quando compartilhou o post no Facebook, no dia 20 de fevereiro, uma venezuelana disse que a brasileira não sabia do “genocídio que estava acontecendo na Venezuela”, segundo o relato de Pietra, e então iniciou-se uma discussão. No dia seguinte, quando abriu o Facebook, viu que a discussão foi tomando proporções mais amplas e Pietra, tentando evitar que isso tomasse proporções virais, resolveu excluir aproximadamente 17 pessoas de seu perfil no Facebook.Quando abriu a página de sua empresa na rede social, Pietra viu que a mesma venezuelana, Alexandra Pirela, que mora em Houston, mas já viveu no sul da Flórida, publicou uma mensagem dizendo que apoiava o Samba Gourmet até que “descobriu que a sua dona era uma comunista, e por isso deveria ir para Cuba, Rússia ou China”, de acordo com o relato da brasileira. “Comecei a receber mensagens dela pelo (aplicativo de celular) Viber. Depois, outras pessoas que eu nem conheço começaram a me mandar mensagens, uma delas publicou uma foto da minha empresa, deu meu endereço e eu comecei a temer por minha integridade física”, disse ela.
A sensação de incerteza foi agravada quando um dos clientes grandes do Samba Gourmet suspendeu encomendas “até a poeira baixar”, o que deixou Pietra tão preocupada que quase não trabalhou por aproximadamente duas semanas, tentando conter o grande incêndio que um comentário no Facebook causou. “Eu percebi o quanto os venezuelanos são ressentidos com tudo que está acontecendo”, disse.
Mas o efeito foi viral. Posts contra ela foram reproduzidos milhares de vezes, vistos por pessoas em todo o país e Pietra continuou recebendo ameaças. “Nós calculamos e acho que esses posts foram vistos mais de um milhão de vezes”, disse. “Depois de duas semanas, este mesmo cliente que havia suspendido os pedidos voltou e pouco a pouco acho que estou conseguindo voltar ao normal. Espero!”
Um anúncio criado na rede social Twitter associa o Samba Gourmet a outros dois restaurantes venezuelanos, pedindo boicote e chamando os proprietários de “Comunistas Radicales”, em espanhol. “Disseram que eu fui transformada em um bode expiatório”.
Ação legal
Pietra agora estuda com seu advogado de que forma irá entrar com ação contra as pessoas que a difamaram. De acordo com empresária, seu advogado disse que ela sofreu difamação e “cyber stalking”. “Respeito a luta deles, mas agora vivo com medo. Quero me mudar de Doral, pois, imagine, 95% das pessoas ficaram contra mim. Meu carro tem a estampa de meu negócio e depois disso nem sei do que as pessoas são capazes”.Líderes comunitários se preocupam com a reação
Em reportagem sobre a história de Pietra, a emissora de rádio “WLRN” conversou com o líder comunitário Luis Ramires, presidente da Câmara do Comércio Venezuelana Americana, que boicotes como esse não representam a maioria da comunidade venezuelana imigrante. “Esse tipo de tratamento injusto é algo que tentamos evitar ao imigrarmos para os Estados Unidos”, disse Ramires à emissora.
