Um exemplo de força de vontade e determinação. Essas palavras fazem parte do cotidiano do brasileiro Carlos Roberto Oliveira, ou simplesmente, Carlão. Quando tinha apenas um ano e meio, o garoto de Porto Alegre foi diagnosticado com poliomelite e teve que aprender a “viver a vida” numa cadeira de rodas. Mas limitação é uma palavra distante do seu dia a dia. Persistente, Carlão viu no esporte a porta de entrada para a felicidade e hoje se dedica inteiramente a ser maratonista cadeirante. Foi campeão diversas vezes em Porto Alegre e outras cidades brasileiras. E também já faz o seu nome por aqui. Venceu em New York e ficou em terceiro lugar na Maratona de Miami. Um vencedor e um exemplo para milhares de pessoas portadoras de deficiência física. O Gazeta entrevistou Carlão e descobriu de onde vem tanta força.
Como e quando você descobriu que queria ser um maratonista cadeirante?
Tive o primeiro contato com o esporte através do basquete, mas me movia com muita rapidez na quadra, tinha muita resistência e não gostava de esporte coletivo, por isso migrei para o atletismo. Comecei nas provas de 400, 800 e 1.500 metros, chegando a ser campeão brasileiro na de 1.500 e
vice, nas de 400 e 800. Foi um pulo para provas mais longas, 5.000 e 10.000, daí para a maratona foi só questão de tempo.
Quais as maiores dificuldades que você enfrentou para começar?
Informação, aliás até hoje é um dos grandes problemas no Brasil. Não há bibliografia no país que verse sobre corrida em cadeira de rodas. Existem “raros” professores de educação física e treinadores que saibam o que é necessário para garimpar e desenvolver um grande atleta. Para o técnico e atleta cadeirante, a demanda de tempo e determinação são maiores que as outras modalidades. As pernas tem de serem vistas como a extensão do corpo, e até chegar nesse grau de sensibilidade, existe o acertar e errar, que é bastante dolorido e frustrante. A técnica da corrida em cadeira de rodas é extremamente complexa e é conhecida por muito poucas pessoas no Brasil e fundamental para que um atleta chegue ao topo.
O que você acha do esporte paraolímpico no Brasil? Existe incentivo por parte do governo e associações? O esporte paraolímpico no Brasil, infelizmente não tem chegado à base de “todas” as modalidades. Falo da minha que é a que conheço mais e a mais discriminada. O custo de uma cadeira de rodas afasta muitos potenciais patrocinadores (uma standard custa em torno de U$ 3.500 e ainda não existem no Brasil). Além da manutenção do equipamento, que dura em média de 5 anos. O Comitê Paraolímpico Brasileiro (CPB), é o grande culpado por não termos mais corredores em cadeiras de rodas, em atividade no mundo. O CPB congrega as Federações Nacionais de atletas, como Associação de surdos, cegos, deficientes mentais, etc. A ABRADECAR (Associação Brasileira de Desporto em Cadeira de Rodas), que rege as atividades de atletas “cadeirantes” está indisponível para receber verbas federais. Mas o Comitê que as recebe, não cria mecanismos para que essa verba chegue até os atletas. Quanto ao incentivo, o empresariado brasileiro ainda tem um pensamento retrógrado em relação ao atletismo em cadeira de rodas. Para se ter uma ideia, na busca de patrocínio, ouvi de um empresário que “não seria legal associar a imagem da empresa dele à uma pessoa aleijada”.
Você conseguiu patrocínio? Quem te ajuda a realizar o seu sonho de maratonista?
Eu tenho o “apoio” da Crystal e TNT e WIN SPORTS, porém não é suficiente para todas as despesas. Recorro a empréstimos bancários para as despesas nas competições. Venci a Achilles Track Club, em NY, em 2001, saindo do Brasil com empréstimos e essa vitória me deu 2/3 de página do NY Times. Me considero um vencedor, trabalho 8 horas diárias no jornal Zero Hora, de Porto Alegre. Tenho tempo para meu lazer, família e treinar é claro...sirvo de espelho para muitas pessoas. Tenho também muitos amigos nos EUA e eles sempre me dão um apoio.
Qual o seu maior objetivo?
Acho que maior não tenho, já participei, com destaque das maiores maratonas do mundo, já consegui incentivar e formar um atleta que chegou a medalha de prata em campeonato mundial. Conseguir influir positivamente na vida de uma pessoa é algo indescritível. Por uma felicidade do destino encontrei um garoto com o seguinte quadro: Jovem, com sequela de paraplegia por arma de fogo, usuário de álcool, drogas e sem perspectiva de vida. Através do meu incentivo, hoje já é um cidadão, casado, tem uma vida estável, atleta bem sucedido, com um círculo social formidável. Essa é a minha maior vitória, meu maior troféu. Sem condições financeiras, mas com muito boa vontade consegui transformar a vida de uma pessoa, isso é importante. Alguns troféus meus se quebraram, outros foram doados, outros perdidos, mas esse carrego comigo para o resto da vida. E como atleta, nesse ano, ainda quero figurar no Guinness Book.
Como um cadeirante pode iniciar um esporte ou até mesmo se tornar um maratonista?
Vontade é primordial! Entendo que nós, que temos uma limitação física, correr uma maratona é algo desafiador, pois convivemos diariamente com a quebra de limites e quebrar o limite de uma maratona é fantástico. Neste ano tenho a satisfação de me acompanharem como Equipe FastWheels, da cidade de Santos/SP, que estará com 02 atletas e um técnico, todos
fazemos parte da Achilles Brasil.
O que você diria para outras pessoas com deficiência física sobre a conquista da liberdade através do esporte?
Dou muitas palestras motivacionais e sempre digo que quando as pessoas dizem que estou “preso a uma cadeira de rodas” digo que não, muito pelo contrário, ela é quem me dá liberdade de ir e vir, foi com ela e por causa dela que conheço os quatro cantos do planeta, é com ela que sou reconhecido no meu país e fora dele, é por causa dela que estou dando esta entrevista. Às pessoas com deficiência sempre digo: “O DIFÍCIL DEMORA UM TEMPO, O IMPOSSÍVEL UM POUCO MAIS”.
Para mais informações sobre a Maratona em Miami, visite o site oficial:
www.ingmiamimarathon.com

