O que move um número cada vez maior de mulheres a assumirem, sozinhas, a criação dos filhos? Elas lutam contra a solidão, os traumas emocionais e as inseguranças. Mas não perdem a força e a vontade de ter uma família feliz. Afinal, coragem e amor de mãe são dois elementos que valem muito.
Há exatos vinte anos, a hoje professora de História Jane Negreiros, 40 anos, recebeu uma notícia que seria determinante para as escolhas que faria em sua vida dali por diante: estava grávida do ex-namorado. Os dois estavam separados mais tiveram uma recaída "certeira". "Eu fiquei muito assustada. Nós tínhamos uma relação dificílima e, naquele momento específico em que eu descobri que estava esperando a Natália, estávamos muito brigados. Meus amigos, os amigos dele e minha família me ajudaram demais nesse momento, jamais imaginei que seria tão bem apoiada.
O ex-namorado acabou aceitando registrar a criança, mas voltou para a casa da família em Goiânia. "Nunca fez absolutamente nada pela filha e não temos notícias dele há pelo menos dez anos", revela Jane, que na época era vestibulanda e recebeu apoio para estudar e se formar, morando com a filha na casa dos pais. "Minha mãe já estava aposentada e virou mãe de nós duas durante uma época. Não sei o que seria de nós sem eles", reconhece.
Mas, para muitas mães solteiras - quase sempre também mulheres magoadas -, é difícil calar as próprias feridas. A atriz T. A., 28 anos, mãe do menino P., 7 anos, reconhece a influência de suas mágoas na formação da identidade do pai do menino perante ele. "Não tenho ódio, nem pena. É indiferença. Quando meu filho pergunta, digo que o pai dele sumiu, que foi uma pessoa que passou pela nossa vida, me deixou ele e que de agora em diante somos só nós dois. Costumo dizer que tenho amor em dobro, de pai e de mãe. Se meu filho tiver vontade de conhecer, procurar o pai, não vou embarreirar, mas confesso que não gostaria que eles se conhecessem. Nunca viu a criança, não deu nome, é um desconhecido completo. Teria muita dificuldade em perdoar", reconhece T. Entretanto, a Dra. Selma reforça: "Mesmo sem atuar, esse pai existe, é desse filho e ele tem o direito de conhecê-lo. Por isso, a importância de respostas sempre consistentes e coerentes a respeito deste assunto".
Outra discussão comum é sobre os efeitos que a ausência de um pai poderia causar na formação das crianças, sobretudo dos meninos. A psicóloga americana Peggy Drexler, que lançou no começo do ano o livro "Raising Boys Without Men" (Criando Meninos Sem Homens - Ed. Rodale Press), defende em sua obra que as mulheres são capazes de passar valores como moralidade e masculinidade a um menino, sem a obrigatória convivência com os pais. "Elas têm a oportunidade de criar um tipo diferente de homem, forte e sensível, capaz de entender que as emoções são valiosas", diz ela em seu livro.
Dra. Peggy comenta ainda que existe, nos Estados Unidos, uma falsa percepção de que a maior parte dos meninos cresce em famílias com pai e mãe. "A verdade é que 23% dos lares americanos se encaixam nesta categoria. De 1970 para cá, o número de mães solteiras aumentou em cerca de 5 milhões", aponta a psicóloga. Mas isso não diminui a importância de uma figura masculina para a criação dos pequenos. "Essa falta é sentida e suprida naturalmente. Quando não tem um pai presente, a criança escolhe sozinha um tio, um avô, um amigo da família, um irmão como ícone masculino com quem ter esse vínculo", acrescenta a psicóloga infanto-juvenil Selma Brando.
Foi exatamente assim com P., filho da atriz T. A.. Em pequenos atos, o menino já demonstra que elegeu o tio, irmão de sua mãe, como referência masculina. "Ele quer deixar o cabelo crescer como o do tio, usa as tiaras dele, quer ficar parecido. Fico feliz porque meu irmão é um ótimo exemplo de homem honesto, de bom caráter, e ainda é padrinho dele", comenta T.
Orgulhosa por sua missão de ter criado Natália, "uma menina com uma cabeça maravilhosa", sem a ajuda do pai, a professora Jane, no entanto, ressalta a importância do apoio de amigos e família. "Em alguns momentos somos tomadas de uma ilusão de que podemos dar conta de tudo sozinhas. E isso é viver sob uma pressão horrorosa, simplesmente porque é impossível. Não haveria como ter cursado uma faculdade, me formado e começado a trabalhar sozinha com um bebê. Se a Natália estudou, comeu, se moramos num apartamento nosso, se ela está fazendo faculdade é porque meus pais entenderam minha situação e viabilizaram meus estudos, sou muito grata a eles", reconhece.
A Dra. Selma ressalta os riscos dessa ilusão de onipotência. "Muitas mães solteiras vêem os filhos como projetos pessoais e depositam neles expectativas com que eles não podem arcar. E acabam compensando a insegurança da solidão na criação com uma dificuldade de impor limites", alerta.

