Há um ano, milhões de ucranianos começaram a deixar seu país, fugindo das bombas disparadas pela Rússia. Mulheres e crianças, em sua maioria, foram morar em outros países da Europa ou até mais longe, como no Brasil, enquanto os homens ficaram para lutar. Mas, apesar do cenário de destruição mostrado ao mundo ao longo dos últimos 12 meses, o chefe da Embaixada da Ucrânia, Anatoliy Tkach, avalia que a estratégia militar russa em território ucraniano fracassou.
Em entrevista exclusiva à Agência Brasil, ele conta que os territórios ocupados pelos russos vêm sendo recuperados pelas tropas ucranianas. Segundo Tkach, a Rússia passou a enviar criminosos condenados para o front, o que ele classifica como uma evidência desse fracasso. E acrescentou que seu país prepara uma contraofensiva para liberar mais territórios ucranianos do domínio do país vizinho.
O chefe da embaixada da Ucrânia no Brasil também explica que a atual guerra poderia ter sido evitada caso o ocidente tivesse reagido, em 2014, durante a anexação da Crimeia pela Rússia, da forma como reagiu em 2022, quando os russos avançaram em território ucraniano.
Anatoliy Tkach estima que os bombardeios na Ucrânia resultaram em pelo menos US$ 46 bilhões em prejuízos, uma vez que “um terço do território está contaminado com objetos explosivos”. A queda no PIB foi superior a 30% e, em meio a esse cenário, pelo menos 6 milhões de pessoas deixaram o país.
A guerra e a troca de acusações provocou uma tensão grande o suficiente para separar Ucrânia e Rússia até mesmo nas páginas de uma entrevista. Ao receber a Agência Brasil e ser informado que o outro lado da história também seria ouvido, Tkach fez uma exigência: “não quero estar na mesma matéria [que a Rússia] porque não há relações diplomáticas entre nossos países”.
Na semana em que a guerra na Ucrânia completa um ano, a Agência Brasil entrevistou os embaixadores dos protagonistas do conflito. Confira também a entrevista com o embaixador da Rússia,
A TV Brasil veiculará, no programa Repórter Brasil deste sábado, às 19h, trechos da entrevista, que será também disponibilizada no site do programa.
Agência Brasil:
Dia 24 completou um ano da guerra entre Rússia e Ucrânia. Qual o balanço que já se pode fazer? O cenário atual era o imaginado há um ano?
Anatoliy Tkach:Esta guerra se iniciou em 2014 [quando a Rússia anexou a Crimeia]. Em 2022, começou uma invasão em grande escala do exército russo na Ucrânia. Nossas forças armadas estão, desde o primeiro ataque, defendendo o país, parando as forças russas. Liberamos quase a metade dos territórios que foram ocupados no primeiro momento, e chegamos ao final do ano com as nossas terras liberadas. Neste momento, estamos mostrando que a estratégia militar russa fracassou e vem tendo grandes perdas. Estão tentando encobrir isso com uma mobilização em massa das pessoas na Rússia. Entre eles, criminosos condenados com altas penas. Enviam esse tipo de pessoas em grande quantidade para a Ucrânia.
Neste momento, com equipamentos pesados não podendo passar, estamos observando o início de uma nova ofensiva. A estratégia russa agora é mandar muito pessoal, mesmo mal preparado e sem equipamento. Essa grande quantidade de pessoas está fazendo muita pressão sobre as forças armadas ucranianas, mas nosso exército está protegendo a Ucrânia, segurando suas posições. As tropas russas não têm obtido maiores avanços, e estamos nos preparando para fazer uma nova contraofensiva para liberar territórios da Ucrânia.
Agência Brasil:
Quais são as expectativas para os próximos meses na Ucrânia?
Tkach:Estamos esperando que, no próximo mês, tenha início uma nova escalada. Estamos nos preparando para isso. Nossos parceiros estão avaliando esse perigo e enviando equipamentos para a proteção do nosso país. É muito importante esse ponto porque a Ucrânia não está conduzindo uma guerra. Está se protegendo contra uma invasão estrangeira.
Além disso, estamos preparando ações diplomáticas para o fim desta guerra iniciada pela Rússia, como a resolução aprovada na Assembleia Geral da ONU sobre a paz duradoura e justa na Ucrânia. Há também um plano de ações para que essa guerra termine. No dia 15 de novembro de 2022, nosso presidente, Volodymyr Zelensky, ofereceu o plano chamado “A Fórmula da Paz”. Ele inclui dez passos para o estabelecimento de uma paz duradoura e justa na Ucrânia. É uma fórmula bem abrangente que prevê todos os assuntos importantes para que a paz volte a nosso país. Aborda segurança alimentar, segurança energética e segurança nuclear.
Agência Brasil:
Qual é a proposta efetiva da Ucrânia para uma solução pacífica? Fale mais desse plano de paz.
Tkach:É um plano de paz bem abrangente. Além de mencionar essas questões, trata da libertação de presos e deportados; do respeito à carta das Nações Unidas; da restauração da integridade territorial da Ucrânia e da segurança de meio ambiente. E também da retirada das tropas russas do território da Ucrânia e de garantias para que a agressão não volte, fixando o fim da guerra.
Com relação à proteção do meio ambiente, por exemplo, estima que os danos causados chegam a US$ 46 bilhões de dólares até esse momento, porque um terço do território da Ucrânia está contaminado com objetos explosivos. Até agora, foram desativados aproximadamente 500 mil desses objetos. Isso é um ponto importante do plano de paz.
Agência Brasil:
Como está a economia ucraniana? Quais setores foram afetados?
Tkach:Evidentemente que a guerra está provocando uma crise econômica no país. No ano passado, calcularam perdas de 30,4% do nosso PIB [Produto Interno Bruto]. Para este ano está previsto um deficit de US$ 38 bilhões. Muitas empresas sofreram, muitas foram realocadas dos territórios onde ocorrem ofensivas.
A economia foi danificada pelo bloqueio da Rússia aos portos da Ucrânia no Mar Negro. Se, dentro da iniciativa do “Corredor Verde” [corredores humanitários para facilitar a fuga de civis da Ucrânia], fossem desbloqueados os envios de grãos, ficaria facilitado o escoamento de alimentos e grãos produzidos na Ucrânia para outros países. A Ucrânia também teve uma iniciativa, que consiste em que os países comprem nossos grãos e os enviem para os países que mais precisam de alimentos. O governo da Ucrânia, ao lado de 30 países da União Europeia, participou dessa iniciativa pagando o envio desses grãos.