Faz mais de uma década que os norte-americanos começaram a conhecer de perto a sedução da carne brasileira. De lá para cá, o negócio do sistema de churrascos rodízio, que no Brasil já se mostrava um excelente negócio, profissionalizou-se, expandiu-se, e, principalmente, seduziu de forma irremediável o público norte-americano.
Embora não haja números precisos estima-se que existam nos EUA entre 250 e 300 churrascarias rodízio, instaladas em pelo menos 38 estados.Este filão de mercado está em franca expansão, e deixou de ser um negócio tipicamente brasileiro. Os norte-americanos perceberam que além de comer bem, esses brasileiros também sabem fazer dinheiro, e muito.
O negócio tornou-se tão atrativo que há dois meses, empresários do Mississsipi inauguraram uma nova churrascaria localizada no Imperial Palace Cassino, um prédio de 37 andares. O investimento chegou a $22 milhões, muito superior à media de $ 5 milhões neste segmento. A proporção do investimento refletiu-se, também, na ambientação da casa batizada Carnaval de Brasil. Lá, o público encontra, por exemplo, cascatas com fogo, que ajudam a dar um tom de grandiosidade ao local.
Neste momento, existem pelo menos nove churrascarias rodízio em fase de projeto ou prestes a abrir no país. Ocupando uma área de 13 mil pés quadrados, com capacidade para 350 lugares, e previsão de inauguração em novembro, a Rioz Brazilian Steak House será a única churrascaria rodízio de Myrtle Beach, uma região nobre de South Carolina, cercada por 1,8 mil restaurantes.
Mas em um ambiente de negócios tão competitivo, os brasileiros têm uma vantagem que praticamente tira qualquer restaurante convecional do caminho: a garantia de que nenhum desejo gastronômico deixará de ser atendido.
O gaúcho Orlando Preissler, que chegou aos EUA há 10 anos a convite da rede Fogo de Chão, para implantar no país algumas das unidades do grupo, e em seguida realizou trabalho semelhante para a rede Boi na Brasa, agora tem participação no negócio da Rioz Brazilian Steak House.
Ele foi convidado por investidores norte-americanos do grupo Tbonz para implantar o novo empreendimento. “Há seis anos, os sócios viajaram e conheceram o sistema rodízio, no Rio de Janeiro, e ficaram impressionados. Eles viram ali um grande negócio para implantar em South Carolina”, conta Preissler.
Experiente no ramo de churrascarias rodízio, e um dos pioneiros nos EUA, Preissler avalia que o segmento está em franca ascenção, e diz que o segredo do sucesso está no profissionalismo e na autenticidade do serviço. “Eu já vi vários grupos entrarem aqui, mas aqueles que sobrevivem, e que têm sucesso, são os que chegam com profisisonalismo e muita vontade de trabalhar e de desenvolver esse projeto. São grupos realmente autênticos no ramo de churrascaria”, analisa.
Ele compara o sucesso do segmento nos EUA ao processo ocorrido no Brasil, há mais de 20 anos, quando as peculiaridades tipicamente gaúchas de fazer e servir carne foram levadas para os grandes centros do sudeste, e acredita que este movimento de ascenção do rodízio nos EUA ainda terá vida longa. “Comparo isso com os gaúchos saindo do Rio Grande do Sul, montando suas churrascarias em São Paulo e no Rio de Janeiro. Houve uma ascenção tremenda durante mais de duas décadas, e hoje existe uma concorrência muito grande no RJ e em SP.
Isso provavelmente acontecerá em duas ou três décadas aqui, e se encontrará em toda e qualquer cidade um rodízio. Por enquanto ainda é necessário divulgar o conceito do rodízio”, estima.
Este processo de internacionalização de um negócio baseado em uma maneira tipicamente brasileira de preparar, cortar e servir a carne, começou na década de 90, tendo como carro-chefe o jeito farto de servir do rodízio, que enche os olhos e o estômago.
O ambiente, envidentemente, era propício, com uma clientela prédisposta a deixar-se levar pelos prazeres da carne, mas alguns ingredientes econômicos deram um empurrãozinho. O plano Real, que na ocasião elevou a cotação da moeda brasileira em relação ao dólar - que passou a custar R$0,86 - deu o empurrão que faltava para que decisões de investimento fossem feitas. A partir dalí, não levou muito tempo para que o negócio maturasse e se expandisse por todos os EUA, e até mesmo Europa e Ásia.
Resultado deste processo, o Gaúcho Rodízio, tradicional casa de Light House Point, ajudou a transformar o churrasco brasileiro em sinônimo de uma experiência gastronômica inesquecível. “Hoje o nosso churrasco é sinônimo de Brasil, como são a feijoada e a caipirinha”, diz Nelson Ramos Júnior, gerente do Gaúcho.
A casa consome por mês cerca de 3 mil Kg de carne. O movimento de clientela cresce entre 25% e 30% ao ano, estima Ramos Júnior. “Esse é o business do momento, e isso é bom para todo mundo. Há espaço para todos”, diz ele, acrescentando que um dos segredos do sucesso está em ter pessoal especializado. “Tem que ser um amplo conhecedor. O nosso churrasqueiro trabalha há 15 anos nesse ramo. Ele sabe desde a compra da carne até o atendimento ao cliente. Esse é o principal ponto. Não adianta saber fazer uma carne bem feita, e não saber servir. Nosso pessoal é treinado em todas as áreas”, afirma.
Embora reconheça ainda haver alguma dificuldade para recrutar mão-de-obra especializada, Ramos Júnior diz que se tivesse que abrir sua própria churrascaria, abriria aqui, e não no Brasil. “Abriria aqui justamente por saber da segurança de crescimento do negócio. No Brasil a burocracia é muito grande, os tributos são altos, e o custo de manutenção de funcionários também é elevado”, conclui.
Em fase de expansão, a churrascaria Chima, em Fort Lauderdale, está preparando para dezembro a inauguração de filial em Washington, D.C, para fevereiro na Filadélfia, e já iniciou entendimentos para implantação de outra filial em Atlanta.
Com uma ambientação sofisticada, com enormes tochas de fogo na entrada, a casa tem uma freqüência principalmente de norte-americanos. A coordenadora de Eventos, Lília Silva, diz que, além da comida, é claro, a atmosfera acolhedora do lugar é um dos grandes atrativos. “Aqui em Fort Lauderdale é o único lugar que oferece uma atmosfera tão interessante e prazeirosa”, ressalta.
Ela considera que o que mais impressiona a clientela não-brasileira é o conceito em sí do rodízio. “É um serviço desconhecido para eles, e a partir do momento que conhecem não deixam mais de vir. Quem vem pela primeira vez fica também muito impressionado com a quantidade de ítens no salad bar, além da carne, é claro”, afirma.
Gerente da Texas de Brazil, em Miami, Giovanni Bamdomo, que apesar do nome com jeito italiano é norte-americano, está tendo sua primeira experiência à frente de um rodízio e diz que, apesar de sua experiência no ramo de restaurantes, teve que aprender praticamente tudo. “É tudo diferente, a maneira de colocar a mesa, o tipo de serviço, tudo”, comenta.
A rede, que começou a funcionar nos EUA em 1998, e inaugurou a unidade de Miami em 2004, é uma das mais conceituadas da região, e tem atualmente oito filiais. O grupo está ampliando seu número de filiais para 12. “O que mais atrai a clientela é o conceito de tudo o que você pode comer por um preço fixo e a seleção de carnes e diferentes cortes. E, é claro a atmosfera e a qualidade do nosso serivço”, diz Bamdomo que também tornou-se um fã do churrasco brasileiro e vê na carreira um grande futuro.
Ele recebe, em média 20 pessoas diariamente buscando emprego. A exemplo das demais churrascarias a Texas de Brazil também oferece treinamento.
Natural de Foz do Iguaçu, no Paraná, Kleber Krul está nos EUA há seis anos, e há um ano é um dos passadores de carne (é assim que são chamados os garçons nos rodízios) da Texas de Brazil.
Embora não tenha nascido na terra do churrasco, ele diz que aprender a lidar com a carne é uma questão de tempo. “Depende muito da pessoa. Como brasileiro achei mais fácil, já tinha uma noção e compreendia o conceito do rodízio. Para um americano ou um hispânico pode não ser tão fácil, mas é possível aprender”, diz.
Uma das grandes referências em matéria de sucesso nos EUA, a rede Fogo de Chão dos irmãos Arri e Jair Coser atende atualmente a dois milhões de clientes por ano em seus onze restaurantes aqui e no Brasil, com um faturamento que cresce de 25% a 30% anualmente. Com tudo isso, a rede tornou-se recentemente a primeira rede brasileira a firmar parceira com um grupo internacional.
Vendeu 40% de suas ações por $64 milhões para o grupo norte-americano GP investments. Os irmãos prevêem fechar o ano com um faturamento de aproximadamente $96 milhões. “Essa parceria permitirá um aumento no ritmo de expansão da rede, que pretende abrir duas lojas a cada ano”, disse Arri Coser ao comentar recentemente os negócios do grupo.
A história de sucesso da Fogo de Chão, tem servido como inspiração para dezenas de empresários do ramo. E não é para menos. Atualmente, quase 80% do faturamento do grupo são provenientes dos EUA. A rede investe pesado no treinamento de seus funcionários e mantém um centro de instrução que oferece 500 horas-aulas de inglês por ano, além de lições de gastronomia e enologia (especialização em vinhos).
O Restaurante Brazilian Tropicana, primeiro restaurante rodízio dos EUA com show brasileiro ao vivo, fundado há praticamente duas décadas, acabou de instalar-se em novo endereço, em Boca Raton.
Ponto turístico tradicional para norte-americanos vindos de outras regiões do país, o Tropicana já é parte do roteiro “obrigatório” para quem vem conhecer a Flórida. Com um ambiente marcado pela sofisticação, o espaço do restaurante foi ampliado para oferecer a qualidade de carnes e serviço que são marca registrada do restaurante.
Sucesso dos vinhos
Os rodízios mostraram-se também a grande porta de entrada para os vinhos brasileiros nos EUA. Há dez anos no ramo de importação e comercialização de vinhos brasileiros aqui nos EUA, Gelson Cardoso, proprietário da GM Miolo USA, com sede em Fort Lauderdale, conta que atualmente vende uma média de 5 mil caixas mensalmente, o correspondente a dois contêineres. “Todo ano duplicamos o volume de vendas”, comemora ele, afirmando que os restaurantes rodízio foram a alavanca de sucesso para a colocação e divulgação do vinho brasileiro neste país.
É ele quem, melhor do que ninguém, calcula a dimensão da expansão dos rodízios nos EUA, e conhece cada nova casa aberta. “Trabalhamos em cima da abertura das churrascarias. O cliente americano experimenta o vinho na churrascaria, e isso vai se espalhando”, explica Cardoso, acrescentando que não está “dando conta de acompanhar o crescimento do mercado, em função da abertura de mais e mais churrascarias rodízio”. Ele calcula que os rodízios representem hoje 70% de sua distribuição, por intermédio de agentes locais nos diversos estados.
Os segredos da carne
Embora, como em qualquer esfera das artes culinárias, haja divergências e segredos irreveláveis, algumas dicas de autênticos churrasqueiros gaúchos podem ajudá-lo a conhecer um pouco mais sobre como explorar ao máximo as delícias da carne.
1 - Carnes grandes e sem osso vão para a grelha, como picanha, maminha e contrafilé.
2 - Costela, salsichão e medalhões de picanha assam melhor em espetos. No entanto, a polêmica entre grelha, que não deixa a carne perder o suco, e o espeto, que permite posicionar a carne de qualquer lado, não deve ser levada à ponta de faca. O importante, é saber controlar o fogo e a carne na medida certa. Se você não domina a técnica, siga a regra a cima e não corra riscos.
3 - O sal antes do fogo endurece a carne. Para esse regra não há meio termo. A única variação é a salmoura (com água quente). Nunca deixe a carne salgada antes de botar no fogo. É carne dura e seca na certa.
4 - Na hora de comprar a carne, lembre que a cor deve ser vermelha, puxando para o rosado. Evite carnes de cor vermelha escura que, indicam que estão há muito tempo no gelo.
5 - No caso da costela, atenção ao corte transversal do osso. Osso chato e grande é sinal de vaca velha. Ossos pequenos e arredondados são de novilho.
6 - A gordura não pode ser de cor amarela escura (animal velho), deve ter cor de manteira.
7 - Quando for usar carne maturada (embaladas à vácuo, e amaciadas à força, mas com procedência garantida), não esqueça de abrir o pacote meia hora antes de levar ao fogo, para tirar o cheiro. Se preferir deixe a carne sob água corrente por um minutinho.