Adriana Tanese Nogueira*
Seria a falta de concentração um “defeito” da pessoa? Um distúrbio, como quando se tem uma cárie no dente ou se é míope? O assunto é mais simples do que parece, mas pode ser complicado de avaliar num primeiro momento. Tudo depende da perspectiva que se usa.
Na verdade, todo mundo é capaz de se concentrar. Basta observar as pessoas e as crianças a nossa volta: qualquer um tem um momento de foco. A queixa se refere muitas vezes ao “que” está em foco, quem nem sempre é o desejável. O problema não seria então a incapacidade de se concentrar, mas o objeto da concentração.
Há diversas “camadas” de razões a serem levadas em consideração na questão da falta de concentração. E começamos da mais simples, que qualquer um pode experimentar: uma pessoa não consegue se concentrar porque está cansada.
O cansaço pode ser físico, como no caso de estudantes que trabalham de dia e estudam à noite. O esforço mental é tão cansativo quanto o físico, apesar de muitas pessoas subestimarem isso, pensar e, sobretudo, usar a cabeça cansa tanto quanto fazer ginástica ou trabalhar na construção. Para utilizar bem o cérebro, é preciso estar descansado e com energias disponíveis. Repouso e descanso são indispensáveis.
Em segundo lugar, o cansaço pode ser emocional. Crianças e adultos que vivem em ambientes estressantes, onde, por exemplo, os pais brigam com frequência e o clima da casa é pesado, ou onde relações interpessoais de qualquer tipo (em casa ou no trabalham) demandam muito e portanto desgastam, essas pessoas terão o rendimento intelectual prejudicado. O próprio desenvolvimento da inteligência exige ambiente harmonioso, para que a pessoa possa investir na atividade mental. No caso das crianças, o estresse que elas vivem em casa, ou a ausência de orientação e a sensação de insegurança física e/ou emocional leva a diversos tipos de complicações, desde a falta de concentração a comportamentos que irritam e parecem querer tirar os outros do sério. É como se algo nelas não fluisse, não corresse como deveria, e a criança se torna uma chateação para todo mundo. Terapia familiar e pessoal são a solução aqui.
Em terceiro lugar, o cansaço pode ser intelectual. Quando o que requer concentração é um assunto difícil e novo para a pessoa, ela terá mais dificuldade para se concentrar. A mente foge do esforço (a lei biológica de inércia funciona também no mundo psíquico) a menos que não esteja bem treinada. Nesse caso, a solução é disciplina e perseverança. Além das razões acima, a falta de concentração pode estar relacionada ao objeto no qual a pessoa quer se concentrar. É complicado se concentrar em algo que não suscita o menor interesse. Não somos máquinas e mesmo que o papai, a mamãe, a sociedade, a revista de economia digam que tal emprego, tal estudo e tal projeto sejam vantajosos ou a coisa certa a se fazer, se a alma da pessoa não concordar vai ser difícil conseguir o investimento psiquico necessário para obter sucesso naquele caminho. Neste caso, é preciso parar e reavaliar os próprios valores, escolhas e objetivos de vida.
Enfim, pode ser também que uma pessoa não consiga se concentrar em realizar o que ela quer muito porque não se sente à altura. Algo dentro dela a sabota. Experiências de infância (ou não), preconceitos, hábitos, “medo do sucesso”... Tudo isso pode confluir para fazer com que um indivíduo não alcance o que deseje, mesmo quando o que deseja é bom e proveitoso. Novamente, é preciso parar, reconhecer os nós que atam, desatá-los com atenção e cuidado para efetivamente superar o problema. Receitas não funcionam com o trabalho psicológico porque cada pessoa é diferente e necessita ser entendida em sua particularidade para que os resultados positivos sejam duradouros e eficientes.
Saber-se concentrar é essencial para conseguir qualquer coisa na vida, desde aprender a pregar um botão até escrever uma tese de doutorado. Concentração equivale ao poder do ego, vontade tornada fato, força interior estrutura a vida numa teia de sentido e progresso. Uma pessoa com concentração está inserida numa jornada, num caminho pessoal que leva adiante. Saber concentrar-se é como ter pernas resistentes, sem as quais não se chega a lugar nenhum.
*Adriana Tanese Nogueira é psicanalista e life coach www.ATNHumanize.com

