A desvalorização gradual do dólar, operada com a aprovação tácita dos Estados Unidos, é uma aposta arriscada, embora ainda não o suficiente para que Washington queira inverter a tendência, afirmam analistas.
A moeda americana não pára de perder terreno, há várias semanas, frente à divisa européia, alcançando na quarta-feira(12) um novo piso, negociada a 1,55 euros.
“O dólar simplesmente não consegue se manter”, resume Shaun Osborne, da TD Financial Group.
A explicação cabe em uma frase. Desde o início do ano, “as perspectivas econômicas continuaram se deteriorando, o Fed reduziu as taxas de juros com a perspectiva de continuar reduzindo, os dirigentes americanos se mostram, na melhor das hipóteses, indiferentes em relação ao futuro de sua moeda, e assim o dólar cai”, acrescentou.
Até agora, a queda progressiva da taxa de câmbio do dólar foi um alívio principalmente para os Estados Unidos: em 2007, o país pôde reduzir, pela primeira vez em seis anos, seu déficit comercial.
Mesmo se tacitamente os dirigentes americanos vêem com bons olhos a situação, afirmam querer um “dólar forte”. No entanto, são os mercados que devem fixar livremente a cotação das moedas. Ninguém ignora a mensagem de que, na realidade, Washington está bastante satisfeito com a queda da moeda americana, contanto que isso aconteça de maneira organizada.
Mas a crescente volatilidade e a forte queda do dólar resgistrada nos últimos tempos “sugerem que as condições podem se tornar caóticas”, alerta Osborne.
As repercussões do enfraquecimento do dólar já se fazem sentir fora dos Estados Unidos.
A valorização da moeda japonesa e européia, por outro lado, faz com que Japão e Europa temam pela competitividade de seus produtos no mercado global, afetada por uma cotação forte demais de suas divisas.
Na semana passada, o Programa Alimentar Mundial da ONU advertiu que a distribuição de ajuda humanitária aos países pobres está gravemente ameaçada pela disparada dos preços de produtos agrícolas.
Há, no entanto, quem expresse preocupação em relação às eventuais conseqüências de uma grande desvalorização do dólar.
“O caos no mercado de câmbio pode afetar a vida de milhões de pessoas, já que, uma vez desencadeado o processo, isso pode alimentar um ressentimento social e conflitos políticos que podem mudar o destino de nações inteiras”, alerta a economista Judy Shelton em um artigo publicado no Wall Street Journal.
“Teremos abandonado todo o sentido de responsabilidade associado ao fato de que damos ao mundo sua principal moeda de reserva?”, indaga Shelton.
Entretanto, não se deve esperar uma reação rápida de Washington.
Enquanto o dólar não perder entre 5 e 10% de seu valor em um mês ou dois, não haverá razão para que os Estados Unidos façam algo, afirma Nariman Behravesh, da Global Insight. “Ainda não estamos diante de um movimento brusco, tampouco de um desmoronamento” do dólar, estima.
Além disso, o fantasma da recessão não exige uma linguagem mais enérgica que isso, porque para os americanos o significado mais evidente da fragilidade do dólar é a melhora da balança comercial (média entre as importações e as exportações).
“De um ponto de vista muito egoísta nos Estados Unidos, as exportações poderiam fazer a diferença entre uma recessão moderada e uma recessão mais aguda. Nenhum político vai querer sabotar isso”, explica Behravesh.
Para o analista, o dólar continuará caindo até o fim deste ano, e “o euro chegará sem dúvida a 1,60 dólar”.
Mas não deve ir muito além disso. “Os mercados já se acostumaram com o enfraquecimento da economia americana e com as próximas reduções de taxas”, concluiu Behravesh.

